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Jainismo - a religião mais pacífica do mundo

Atualizado: 11 de jan.

Religião não teísta, austera e ascética


Na postagem anterior, destacamos o pluralismo religioso na Índia e os seus livros sagrados. Abordaremos agora especificamente o jainismo, em duas postagens, a primeira sobre a religião e a segunda focada nas seitas e em questões filosóficas.


Tradicionalmente conhecido como Jain Dharma, o jainismo surgiu no norte da Índia entre 599 a.C. e 527 a.C. (data tradicional apontada pelo jainismo) ou 540 a.C. e 470 a.C. (segundo os acadêmicos). Seu nome deriva do verbo sânscrito Ji (conquistar). Refere-se à batalha ascética que, acredita-se, ocorreu entre os renunciantes jainistas (monges e monjas).


Dharma é um conceito-chave com múltiplos significados. A palavra dharma é frequentemente usada no hinduísmo (Sanatana Dharma), que é a lei universal e eterna no budismo, jainismo e sikhismo. Aparece pela primeira vez nos Vedas.


Dharma pode ser entendido como a lei cósmica que governa a natureza e a vida. Se o indivíduo vive no presente e em harmonia com a lei natural, sem apego aos frutos de suas ações, ele pode gradualmente se libertar do Samsara, o ciclo de nascimentos e mortes.


É uma religião não teísta que tem como ideal religioso a perfeição da natureza do homem. É considerado um Dharma eterno com os Tirthankaras orientando cada ciclo temporal da cosmologia. Os três principais pilares do jainismo são Ahimsa (não violência), Anekantavada (não absolutismo) e Aparigraha (ascetismo).


Uma das religiões mais antigas do mundo em prática até hoje, o jainismo foi capaz de sobreviver e atrair adeptos por meio do patrocínio real de poderes políticos como o Império Maurya (322-185 a.C.). Mais tarde sobreviveu às perseguições sob vários governantes muçulmanos dos séculos XII a XVI, e resistiu aos esforços dos missionários cristãos no século XIX.


A religião tem entre quatro e cinco milhões de seguidores, conhecidos como jainistas, que residem principalmente na Índia, onde somam cerca de 4,5 milhões de acordo com o censo de 2011. Os estados indianos Maharashtra, Rajasthan e Gujarat provavelmente têm a maior população jainista.


Outro estado da Índia com uma população jainista relativamente grande entre seus residentes é Karnataka. Havia muitos jainistas em Lahore (capital histórica de Punjab) e outras cidades antes da partição de 1947. Muitos fugiram então para a seção indiana de Punjab, especialmente na cidade de Ludhiana. Fora da Índia, a África Oriental (Quénia, Tanzânia e Uganda) tem comunidades significativas. Muitos jainistas migraram para o Reino Unido, Canadá e Estados Unidos.



Vida com austeridade e sem prazeres mundanos


O ascetismo é uma doutrina filosófica que defende a abstenção dos prazeres físicos e psicológicos, acreditando ser o caminho para atingir a perfeição e o equilíbrio moral e espiritual. Os ascetas religiosos deveriam viver uma vida com austeridade e sem prazeres mundanos, com a intenção de conquistar o máximo domínio espiritual. Os prazeres carnais, naturais dos seres humanos, seriam considerados pecaminosos e deveriam ser renunciados.


Na comunidade jaina existem monges e monjas, leigos e leigas. Todos seguem a mesma disciplina espiritual quíntupla. Monges e monjas se esforçam para tornar este nascimento como o último, praticando um ascetismo severo. Os leigos seguem práticas menos rigorosas, esforçando-se para alcançar a fé racional e praticar boas ações neste nascimento.


Junto com o hinduísmo e o budismo, o jainismo é uma das três tradições religiosas indianas mais antigas ainda existentes e parte integrante da crença e prática religiosa do sul da Ásia. É uma religião não teísta porque não acredita em um deus onipotente e sim em seres mortais superiores (Devas). Os jainistas também acreditam no princípio de causa e efeito (Karma) e no universo eterno e não criado. Outras características são a não violência, a teoria das múltiplas faces da verdade e uma moral baseada na libertação da alma.


Os Devas não têm poder sobre as pessoas e não são procurados para orientação ou assistência para libertá-las da escravidão kármica. Cabe a cada indivíduo alcançar a salvação ou a libertação do samsara (ciclo de renascimento e morte), aderindo a um rigoroso código de comportamento espiritual e ético. A perfeição do indivíduo é alcançada por meio da prática de uma vida ascética, sem qualquer assistência divina. Nela se enfatiza aspectos como austeridade, autocontrole e renúncia.


Todo ser vivo tem alma


Todo ser vivo, humano e animal, assim como plantas, rios, montanhas, mares tem alma (Jiva) que pode ser mais divina ou mais demoníaca. Cada alma tem sua própria divindade. Portanto, cada indivíduo deve considerar todos os seres vivos como parte dele, não lhes causar nenhum dano e ser respeitoso e gentil com todos.


Cada indivíduo deve lutar contra as paixões e os sentidos corporais para obter a iluminação, ou onisciência e pureza da alma. Ele deve se esforçar para encaminhar a alma para um estado divino e de liberação. Aquele que vencer seus inimigos interiores alcançará o estado superior (Siddha) e será denominado vencedor ou conquistador. Os mais ilustres dos poucos indivíduos que alcançaram a iluminação são chamados de Jina (conquistador).


Os adeptos monásticos e leigos da tradição são chamados de Jain ou Jaina (seguidor dos conquistadores). A matéria e a alma (jiva) possuem naturezas distintas e ao longo da vida o ser vivente, seja humano ou animal, vai tingindo sua alma de acordo com suas ações. A religião jainista propõe a purificação por meio do ascetismo e da doutrina da não violência (Ahimsa).



Assim, todos os seres têm igual valor e estão interligados na corrente da existência por elos Karmicos. O caminho correto para o jainismo é limitar as posses e manter uma vida pura. O apego às coisas é negativo porque desequilibra as almas. Moksha (Nirvana) é o estado em que a alma se liberta do ciclo de nascimento e morte e alcança a pureza máxima, seu objetivo final.


Substância viva e substância inanimada


A realidade jainista compreende dois componentes, Jiva (alma ou substância viva) e Ajiva (não alma ou substância inanimada). A consciência é a essência do eu (ou alma), e suas manifestações são a percepção (simples apreensão) e a inteligência (conhecimento conceitual). A realidade é externa e é percebida pelos sentidos. Tanto jiva quanto ajiva são eternos; nunca existiram pela primeira vez e nunca deixarão de existir.


Jiva, o princípio vital da alma


Jiva não é produto ou propriedade do corpo. É um número infinito de unidades espirituais idênticas, classificadas pelo número de órgãos dos sentidos que possuem. As plantas pertencem à classe mais baixa porque possuem apenas o sentido do tato. Os vermes possuem tato e paladar. Os vertebrados possuem todos os cinco órgãos dos sentidos. Os seres humanos e as almas liberadas possuem o Manas, um órgão sensorial interno adicional, por isso são capazes de raciocinar (Samjnin).


As características essenciais do Jiva são Chetana (consciência), Sukha (bem-aventurança) e Virya (energia). Em seu estado puro, jiva possui essas qualidades ilimitadamente. As almas, infinitas em número, são divisíveis em móveis e imóveis, de acordo com o número de órgãos dos sentidos possuídos pelo corpo no qual habitam.


As almas móveis habitam corpos que possuem entre dois e cinco órgãos dos sentidos. As almas imóveis habitam partículas imensamente pequenas de terra, água, fogo e ar, juntamente com o reino vegetal, que possui apenas o sentido do tato. Além disso, o universo é povoado por um número infinito de seres minúsculos (Nigoda), alguns dos quais estão evoluindo lentamente, enquanto os demais não têm chance de emergir de seu estado infeliz.


Sem forma e sem gênero, jiva não pode ser percebido diretamente pelos sentidos. Como o universo, jiva não tem ponto de origem nem fim. Embora não seja onipresente, pode, por contração ou expansão, ocupar diversas quantidades de espaço. jiva pode preencher tanto os corpos menores quanto os maiores como a luz de uma lâmpada em uma sala pequena ou grande. A alma assume as dimensões exatas do corpo que ocupa. Com a morte, ela assume a forma do último corpo físico que a abrigou.



Ajiva, matéria em todas as suas formas


Ajiva é a matéria (Pudgala) em todas as suas formas e nas condições sob as quais ela existe: tempo, espaço e movimento. A palavra pudgala (massa-energia) é derivada de pum (unir-se) e gala (separar-se), e revela a concepção jainista de matéria como aquilo que é formado pela agregação de átomos e destruído por sua desagregação. A matéria possui características de tato, paladar, cheiro e cor. Sua característica essencial é a falta de consciência.


Os quatro elementos, terra, água, ar e fogo, são animados por almas. As partículas da terra são os corpos das almas elementares chamadas vidas terrenas. A menor unidade da matéria é o átomo (Paramanu). O calor, a luz e a sombra são formas de matéria fina.


As substâncias imateriais não sencientes são o espaço, o tempo e os princípios do movimento e sua suspensão. Eles são sempre puros e não estão sujeitos a contaminação. Os princípios do movimento e sua detenção não existem independentemente, mas constituem uma pré-condição necessária para o movimento ou repouso de qualquer objeto.


Karma, uma cadeia de causa e efeito


A palavra karma significa fazer e refere-se à criação e à reconstituição da matéria kármica que incorpora a alma. O princípio fundamental da doutrina jainista é que todos os fenômenos estão ligados numa cadeia universal de causa e efeito. Todo evento tem uma causa definida. Por natureza, cada alma é pura, possuindo conhecimento, felicidade e poder infinitos; entretanto, essas faculdades são restringidas ao longo do tempo pelo contato da alma com a matéria.


Essa matéria, que produz a cadeia de causa e efeito, de nascimento e morte, é o karma, uma substância atômica e não um processo, como acontece no hinduísmo e no budismo. Os efeitos do karma contemplados no jainismo são mais um conjunto de leis físicas do que de leis morais.


A matéria refere-se tanto à massa das coisas quanto às forças de energia que estruturam essa massa, fazendo-a e refazendo-a nas suas diversas formas. As partículas de karma estão no universo e associam-se a uma alma devido às ações dessa alma. O estado espiritual inicial atrai essa matéria kármica da mesma forma que uma estante de livros acumula poeira.


A quantidade e a qualidade dessas partículas determinam a existência que a alma terá, a sua felicidade ou infelicidade. Uma vez que a matéria se liga à alma, a pessoa fica presa, encarnação após encarnação, na roda do samsara, e não vê a natureza real da alma e da realidade.


Só é possível a uma alma alcançar a libertação quando dela se retirarem todas as partículas de karma. Para se libertar das algemas do karma, a pessoa deve interromper o influxo de novos karmas e eliminar os já adquiridos. Nirjara (desgaste) é o processo que permite a libertação das partículas de karma de uma alma e inclui práticas como jejum, dieta restrita, controle do paladar, retiro para locais isolados, mortificação do corpo e meditação.


Para despertar e alcançar a libertação da matéria, é preciso fazer os Cinco Votos e depois prosseguir com as ações que deles procedem. Essas ações conduzem a pessoa por um caminho de 14 estágios, da ignorância e da escravidão à iluminação e à liberdade.



Meditação


A meditação jaina pretende levar a alma a um estado de completa liberdade das ataduras. Os textos jainas oferecem um guia detalhado sobre técnicas de meditação para alcançar conhecimento e consciência plena. Essas técnicas foram projetadas para ajudar a prática de permanecer afastado dos apegos e dos ódios e assim obter a liberação das ataduras do karma por meio da percepção correta, do conhecimento correto e da conduta correta. Esses três pontos são conhecidos como as três gemas do jainismo, e são imprescindíveis para lograr que a alma se eleve.


Os Cinco Votos


Os Cinco Votos dos monásticos são chamados de Grandes Votos (maha-vrata) e os dos leigos são chamados de Pequenos Votos (anu-vrata).


1. Ahiṃsa (não-violência),

2. Satya (verdade),

3. Asteya (não roubar),

4. Brahmacharya (castidade),

5. Aparigraha (não-possessividade).


Os Cinco Votos direcionam os pensamentos e o comportamento de uma pessoa, pois acredita-se que, conforme alguém pensa, assim o fará. Não basta, portanto, simplesmente abster-se da violência, da mentira ou do roubo; não se deve sequer pensar em tais coisas. Se alguém aderir a essa disciplina, escapará do ciclo do samsara e alcançará a libertação.


Depois de conseguir isso, torna-se um Tirthankara, um construtor de vau (o que atravessa um braço de rio de pequena largura, entre trinta e cinquenta metros, onde a profundidade não exceda de mais ou menos 50cm) que pode mostrar aos outros como atravessar com segurança as correntes da vida, abandonando o desejo, libertando-se da ignorância e recusando as tentações do mundo. No jainismo, o sofrimento é causado pela ignorância da verdadeira natureza da realidade, e a libertação é alcançada por meio do despertar espiritual e da vivência da verdade que se percebeu.


Os 14 passos nas escrituras e nos Cinco Votos


Estágio 1 – a alma definha nas trevas, ignorante de sua verdadeira natureza e escrava das paixões e da ilusão.


Estágio 2 – a alma tem um vislumbre da verdade, mas está atolada demais na ilusão para retê-la.


Estágio 3 – a alma reconhece sua própria escravidão e tenta se libertar, mas ainda está presa aos apegos e à ilusão e cai para trás, para o Estágio 1.


Estágio 4 – a alma, tendo reconhecido a sua escravidão, anseia por libertar-se novamente, mas está suprimindo, em vez de eliminar, os seus apegos e assim permanece presa.


Estágio 5 – a alma tem um lampejo de iluminação e entende que deve fazer os Cinco Votos e aderir a eles para se libertar da escravidão.


Estágio 6 – a alma é capaz de conter até certo ponto seus apegos e paixões por meio da disciplina dos Cinco Votos.


Estágio 7 – a alma supera a letargia espiritual e se fortalece com a prática da meditação e da observância dos Cinco Votos. A autoconsciência cresce, bem como uma visão mais ampla da natureza da própria alma e da realidade.


Estágio 8 – o karma prejudicial é descartado, o autocontrole é aperfeiçoado e uma compreensão mais profunda é alcançada.


Estágio 9 – mais dívida kármica é eliminada por meio da vida consciente e maior percepção espiritual é alcançada.


Estágio 10 – neste estágio, a pessoa eliminou quase completamente os apegos, mas ainda está apegada ao conceito do corpo como si mesmo. Isto é entendido como ganância de um corpo, que é preciso superar para progredir.


Estágio 11 – trabalha-se na eliminação da identificação do eu com o corpo e na liberação de todos os outros apegos. Reconhece-se a natureza transitória das pessoas e objetos aos quais estão apegadas e os libertam.


Estágio 12 – todas as paixões produtoras de karma foram eliminadas, incluindo o apego ao corpo.


Estágio 13 – reconhecendo plenamente a natureza da realidade e da alma, a pessoa se envolve em meditação profunda para se afastar de toda atividade que possa resultar em paixões produtoras de karma e no retrocesso para um estágio anterior.


Estágio 14 – à medida que a pessoa se aproxima da morte, liberta odas as dívidas kármicas e experimenta a libertação de moksha, compreensão completa, sabedoria e liberdade total da escravidão. A alma é libertada e nunca mais encarnará no plano terreno para experimentar o sofrimento e a morte.


Para algumas pessoas, como os Tirthankaras, o Estágio 14 é alcançado muito antes da morte (quando atingem moksha, a liberação). Eles são reconhecidos como conquistadores espirituais (dominaram completamente a si mesmos) e construtores de vaus que então ensinam aos outros como fazer o que eles fizeram.


Os Tirthankaras


Os jainistas desenvolveram sua própria história lendária, Os Feitos dos 63 Homens Ilustres, que os estudiosos ocidentais chamam de História Universal. As figuras mais importantes dessa história são os 24 Tirthankaras, seres humanos aperfeiçoados que aparecem de tempos em tempos para pregar e encarnar a fé.


Eles são considerados almas nascidas como seres humanos, que alcançaram moksha, ou seja, a libertação do ciclo de renascimentos, por meio da renúncia aos prazeres da matéria e da dedicação em transmitir os ensinamentos espirituais aos demais seres humanos.


Os jainistas acreditam que sua tradição não tem um fundador histórico. Parshvanatha (ou Parshva), a primeira figura jainista, ​​foi um professor renunciante que pode ter vivido no século VII a.C. e fundado uma comunidade baseada no abandono das preocupações mundanas. Ele é considerado o 23ºTirthankara da era atual (Kalpa). Vardhamana, conhecido como Mahavira (Grande Herói) foi o 24º e último daquela época.


Mahavira, a escolha de uma vida ascética


Mahavira nasceu perto de Patna (Atual Bihar) e foi contemporâneo de Buda. Era filho de um chefe da classe Kshatriya (guerreiro). Diz-se que ele cresceu como filho de pais abastados que morreram quando ele tinha 28 ou 30 anos. A partir daí ele renunciou ao seu status de príncipe para seguir a vida ascética.


Embora tenha sido acompanhado por um tempo por Goshala Maskariputra, fundador da Ajivika (seguir o modo de vida ascético), uma seita ascética que surgiu na Índia quase ao mesmo tempo que o budismo e o jainismo e que durou até o século XIV, Mahavira passou seus próximos doze anos e meio seguindo um caminho de ascetismo solitário e intenso.


De acordo com a crença jainista, ele não foi o fundador da fé, apenas mais um em uma longa linhagem de sábios iluminados que abandonaram sua ignorância e compreenderam a verdadeira natureza da realidade e da alma. Acredita-se que ele tenha morrido em Pavapuri, perto da moderna Patna.


Os ensinamentos jainistas


Não posse (Aparigraha) – a posse de qualquer bem é relacionada à violência física e psíquica. A violência em todas as suas formas têm origem no desejo de possuir, dominar e controlar. Os ascetas jainas se recusam a possuir seja o que for. Para os leigos a posse de algumas coisas é necessária para a realização das tarefas diárias. A possessividade transitória (usar um ser para abandoná-lo) é uma forma de apego baseada em relações de exploração de poder, por parte de um dos lados, em vez de amor e equanimidade incondicional.


Não absolutismo (Anekantavada) – o conceito de não absolutismo no jainismo faz referência à verdade de forma mais abrangente e livre, sem dogmas e verdades absolutas. Assumir que alguém tem acesso privilegiado à verdade é o mais potente motor de conflito entre os seres humanos. O conceito de não absolutismo refere-se ao pluralismo de opiniões, e à noção de que os vários pontos de vista sobre a verdade não são a própria verdade.


O jainismo encoraja os seus seguidores a considerarem os pontos de vista de outras filosofias, e acreditam que quando qualquer uma dessas filosofias, incluindo a própria jaina, se apega demais às suas próprias ideias comete o erro de considerar o seu ponto de vista absoluto.



Não violência (Ahimsa) – o jainismo ordena evitar todas as formas de lesões, sejam elas cometidas pelo corpo, pela mente ou pela fala. A violência é a agressão intencional ou não intencional. No pensamento é a forma maior e mais sutil de violência porque surge de ideias de apego e aversão, baseadas em estados passionais, que resultam de negligência ou falta de cuidado no comportamento. A não violência é a base do jainismo e o seu ponto central.


Não roubar (Asteya) – a prática de Asteya exige que não se roube, nem tenha a intenção de roubar, a propriedade de outra pessoa por meio de ação, fala e pensamentos. É um dos cinco principais votos do hinduísmo e do jainismo.


Imagem da parábola dos cegos e do elefante, muito utilizada

para explicar o conceito de anekantavada. (Wikipédia)


Vegetarianismo


O vegetarianismo é um modo de vida, tendo sua origem no conceito de compaixão para a vida e sem violência. Sua prática é vista como um instrumento da não violência e da coexistência de importação e cooperativa, ou seja, consumir apenas seres sem sistema nervoso, principalmente do reino vegetal. Isso é visto como a forma de sobrevivência que causa o mínimo de violência contra os seres vivos. As frutas são melhores para o jainismo porque delas é extraída apenas uma parte da planta e não sua destruição total como ocorre se houver raízes ou brotos.


O uso de produtos lácteos é permitido sempre que for obtido e preparado de acordo com as normas ditadas. Em algumas regiões da Índia, como Rayastán ou Karnataka, a influência dos jainas foi tão forte que a prefeitura dos hindus da zona também se tornou vegetariana. Ao que parece, Mahavira foi quem plantou um sistema coerente com conceitos comuns e outros sistemas sramânicos como o ciclo de renascimento do samsara ou a liberação moksa integrada na ideia de respeito por todos os seres vivos.


A não violência como tática política


Notável neste contexto é a amizade entre o leigo jainista Raychandrabhai Mehta e Mohandas Gandhi, que considerou suas interações com Mehta importantes na formulação de suas próprias ideias sobre o uso da não violência como tática política. Ao longo da história, os jainistas foram nobres, reis ou guerreiros de importância.


Os filósofos jainas foram obrigados a integrar o princípio da não violência com a guerra e o governo dos reinos. Essa aparente contradição foi solucionada de várias maneiras, por exemplo, plantando a necessidade de manter a salvo o próprio jainismo ou defender a ideia de que é possível ir à guerra praticando o mínimo de violência necessária.



Categorias dos sistemas de crenças no jainismo


Astika (existência) o que aceitou os Vedas como a mais alta autoridade espiritual; Nastika (não existência) o que rejeitou a autoridade dos Vedas e dos sacerdotes hindus. As três escolas Nastika que continuaram a se desenvolver foram Charvaka, budismo e jainismo. O jainismo foi defendido pelo asceta espiritual Mahavira.


A doutrina jainista é baseada nos seguintes fundamentos ou crenças conhecidos como Tattva, ou seja, uma tentativa de explicar a natureza do ser humano e oferecer soluções à mesma:


Jiva – a essência das entidades vivas. A alma é uma substância diferente do corpo que a abriga. Seus principais atributos são conhecimento, consciência e percepção.


Ajiva – entidades sem vida que consistem em espaço, matéria e tempo.


Asrava – a interação entre ajiva e jiva gera um influxo de karma na alma, à qual está apegado.


Samvara – pela conduta correta, o influxo de karma adicional pode ser interrompido.


Bandha – a escravidão do jiva ao karma restringe seu real potencial de percepção e conhecimento perfeito.


Moksha – a jiva retira seu karma, expressa sua liberdade e tem uma qualidade pura e intrínseca de conhecimento perfeito em sua forma verdadeira.


Niryara – o karma existente pode ser destruído por meio da realização do ascetismo e da meditação.


Conhecimento, fé e prática corretos


As três joias, o conhecimento, a e a prática corretos devem ser cultivados juntos porque nenhum deles pode ser alcançado na ausência dos outros. A fé leva à calma ou tranquilidade, ao desapego, à bondade e à renúncia ao orgulho de nascimento, à beleza da forma, à erudição e à coragem. A fé correta leva à perfeição somente quando seguida pela prática correta. No entanto, não pode haver virtude sem conhecimento correto, a distinção clara entre o eu e o não-eu.


Entrada para o yaina mandir (templo Jain) em Ranakpur (Rajasthan, Índia). Wikipédia


Cosmologia jaina


A cosmologia jaina entende que o universo não foi criado por nenhum deus ou ser supremo e nunca deixará de existir. É independente e autossuficiente e não requer nenhum poder superior para governar. Os primeiros jainas contemplaram a naturalidade da terra e do universo e desenvolveram hipóteses detalhadas sobre diversos aspectos da astronomia e da cosmologia. Segundo os textos jaina, o universo se divide em três partes, os mundos superiores, médios e inferiores. Seus elementos constituintes, são os cinco fundamentos da realidade (Astikayas):


  1. alma,

  2. matéria,

  3. espaço,

  4. princípios do movimento,

  5. suspensão do movimento.


Para os Digambaras existe uma sexta substância, o tempo. Esses elementos são eternos e indestrutíveis, mas suas condições mudam constantemente, manifestando três características: surgimento, estabilidade e desaparecimento.


O tempo


Para os jainas, o tempo é infinito e cíclico, como uma grande roda dividida em duas partes idênticas, equivalente a idades. Uma realiza um movimento ascendente (Utsarpini); a outra um movimento descendente (Avasarpini). Cada uma delas é dividida em seis eras ou Ara. Os dois ciclos unidos fazem uma rotação da roda do tempo, que é chamada de Kalpa.


Esses kalpas se repetem sem começo nem fim. No período ascendente, os seres humanos progridem em conhecimento, idade, estatura e felicidade. Já o período descendente é marcado pela degeneração humana e do mundo, pelo distanciamento da espiritualidade, pelo excesso de complexidade da existência humana, pelo esquecimento da religião e pela perda da qualidade de vida.


Segundo os jainas, vivemos em um período de movimento descendente, em uma era de infelicidade (Dukham Kal), iniciada há 2.500 anos e que durará 21 mil anos.

O jainismo afirma fornecer uma análise mais realista do mundo e das suas complexidades do que o hinduísmo ou o budismo. O mundo faz parte da eternidade que tudo move, impulsiona, cria e transforma. Divide-se em cinco mundos, cada um deles habitado por determinado tipo de seres.


Imagem do século XVII que explica o sistema da cosmologia jainista.


O mundo superior


No topo do universo está a morada suprema (Siddhashila), que é o local onde habitam as almas (Siddhas) que alcançaram a libertação. Abaixo dela encontram-se trinta céus, habitados por seres celestiais, alguns dos quais caminham para a morada suprema.


O mundo celestial (Urdhvaloka) consiste em duas categorias de céu, uma para as almas daqueles que podem ou não ter entrado no caminho jainista e outra para aqueles que estão bem adiantados no caminho, perto de sua emancipação.


No ápice do universo ocupado está o siddhashila, a morada em forma de meia-lua das almas liberadas (siddhas). Finalmente, existem algumas áreas habitadas apenas por Ekendriyas, organismos de sentido único que permeiam o universo ocupado.


O mundo médio


O mundo médio (Madhyaloka) inclui vários continentes separados por mares. No centro está o continente de Jambudvipa, considerado o único continente no qual as almas podem alcançar a libertação. Os seres humanos habitam esse continente e um segundo ao lado deste e parte do terceiro continente.

Mundo inferior


O mundo inferior (Adholoka) é formado por sete infernos, cada um mais escuro e mais doloroso do que o que está acima dele, onde os seres convivem com demônios, em um ambiente de tormento. Abaixo do sétimo inferno encontra-se Nigoda, a base do universo habitada por inúmeras formas inferiores de vida.


Templos


O templo é a instituição jainista mais importante. Os leigos dedicaram suas riquezas à sua manutenção e construção. Os fiéis não permitem que os templos tenham estátuas mutiladas ou danos de qualquer espécie e são considerados os mais bem cuidados da Índia. O templo geralmente contém um local de retiro para ascetas. O ato de fazer doações para a construção de templos é também considerado uma forma de culto, assim como a prática de peregrinações.


O templo mais antigo está localizado em Mathura, no norte da Índia, e pode ser datado entre os séculos II e I a.C. Os templos devem ter sido retiros de ascetas ou simples cavernas. Existem também templos fora da Índia que reproduzem a arquitetura daqueles ali encontrados. Os templos jainistas geralmente têm colunas na entrada. Alguns dos ramos do jainismo não têm templos, como os Taranapanthi, que rejeitam a adoração de imagens dos Tirthankaras.



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