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Escritoras publicadas com seus nomes verdadeiros

Atualizado: 14 de nov. de 2023

O projeto brasileiro OriginalWriters (Escritoras originais) da empresa HP e de uma agência de publicidade quer estimular a leitura de escritoras de romance que usavam pseudônimos masculinos. A empresa decidiu fazer novas capas, para que os leitores possam conhecer a identidade real de suas autoras. O plano ainda inclui a tradução dessas obras para sua publicação em português.

Os livros das autoras do século XIX e do início do século XX, principalmente das europeias, já estavam disponíveis no site Gutenberg Project - que oferece, gratuitamente, mais de 50 mil obras de domínio público. O projeto também inclui a busca por brasileiras que tenham feito o mesmo e que possam ter seus livros disponibilizados gratuitamente.



Na postagem anterior vimos o porquê de escritoras de romance usarem pseudônimos masculinos como assinatura de seus livros. Isso aconteceu não somente nos séculos XVIII e XIX, estendeu-se também ao longo do século XX.

"Isso ainda é comum no mundo acadêmico, nas ciências. Há um viés a favor da autoridade masculina no conhecimento. É um viés que às vezes é implícito, inconsciente. Achamos que isso mudou, mas, na verdade, não mudou tanto assim", afirma a pesquisadora Sue Lanser, professora de inglês, literatura comparada e estudos sobre mulheres, gênero e sexualidade na Brandeis University, nos Estados Unidos.



"Se houvesse qualquer elemento sexual questionável nos romances, ou considerado pouco apropriado para uma dama da sociedade, elas seriam julgadas. O pseudônimo era também uma maneira de proteger a vida pessoal."


Mas segundo a pesquisadora, o fenômeno não desapareceu completamente. Já no início do século XX, a franco-britânica Violet Paget manteve seus escritos – que iam desde livros sobre viagem e música até contos sobrenaturais, críticas de arte, ensaios sobre liberalismo e romances - sob o pseudônimo de Vernon Lee, talvez também para evitar comentários sobre sua homossexualidade.



Nos anos 1990, a escritora britânica J.K. Rowling escondeu seu primeiro nome, Joanne, por sugestão da empresa que publicou sua obra. Em entrevistas posteriores ao sucesso mundial de sua série de livros Harry Potter, ela disse ter sido convencida pelo seu editor a abreviar seus primeiros nomes. Sua assinatura mais ambígua facilitaria que os livros fossem lidos por meninos.



Para escapar das expectativas em torno de seu primeiro romance policial, Rowling também escolheu um pseudônimo masculino,

Robert Galbraith. Mas ela logo foi descoberta.


O livro havia vendido pouco, mas recebeu críticas tão positivas que levantou suspeitas de que não fosse um romance de estreia de um novo autor. Após a revelação, uma primeira edição assinada da obra chegou a ser vendida por mais de R$ 13 mil.


Homens x mulheres

O fenômeno da segmentação de mercado entre "literatura para mulheres" e "literatura para homens" também é algo recente e contribui para que escritoras que querem ultrapassar a expectativa de público para seus livros mudem seus nomes, como no caso de J.K. Rowling e Harry Potter.


Sandra Vasconcelos, professora de Inglês e literatura comparada da Universidade de São Paulo (USP), lembra que os homens também liam romances de ficção. Grande parte dos comentários sobre os romances feitos nos jornais era feito por homens. E alguns dos maiores romances com protagonistas mulheres são de escritores homens. Não havia essa diferença, todos liam tudo.


Para Sue Lanser, hoje, os editores interferem bastante na vida dos livros e dos autores tomando decisões que têm essa suposta segmentação de mercado como justificativa. Ela também concorda que o fenômeno é moderno.


"Agora existe uma dicotomia maior em termos de gênero e práticas de leitura. Desde que Jane Austen, por exemplo, se tornou popular, só nos últimos 20 anos é que os homens pararam de lê-la e não querem mais ter aulas sobre ela", afirma.


É absurdo que se considere, no século XXI, que histórias sobre mulheres, especialmente se têm algum tipo de história de amor no enredo, sejam automaticamente consideradas "literatura menor" e "só para mulheres".



Não podemos mudar a história

Mas se o projeto da HP diz ter a intenção de "reimprimir a história" dessas escritoras usando seus próprios nomes, a pesquisadora Sue Lanser alerta que é preciso tomar cuidado com a ideia.

"É uma boa ideia, mas é importante manter também os nomes com os quais elas publicaram suas obras originalmente. É uma forma de honrar a trajetória dessas mulheres."


Nem todas queriam apenas se proteger com o pseudônimo. Algumas estavam tentando habitar outras identidades. Talvez Mary Ann Evans ou Violet Paget se sentissem, de fato, George Eliot e Vernon Lee quando escreviam.

“Mesmo que algumas delas tivessem tentando se esconder, precisamos também mostrar o nosso passado, não podemos mudá-lo. Não dá para mudar a história e transformá-la em algo que gostaríamos que fosse”.

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