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A Epopeia de Gilgamesh

Atualizado: 12 de ago. de 2023

Quem foi Gilgamesh?


A Epopeia de Gilgamesh, poema épico da literatura suméria que remonta a 2.000 a.C., é considerada a obra de literatura mais antiga da humanidade. A obra narra os feitos de Gilgamesh, rei de Uruk, em sua busca pela imortalidade. Para se ter uma ideia da sua importância, os famosos poemas homéricos surgiram a cerca de 1.500 anos depois dela.



A Biblioteca de Nínive


O último grande rei da Assíria, Assurbanipal, reinou de 668 a 627 a.C.. Além de saqueador do Egito, ele foi o criador da notável Biblioteca de Nínive, considerada a primeira da história. Localizada no palácio de Assurbanipal, em Nínive, a biblioteca possuía uma coleção com milhares de placas de argila contendo textos em escrita cuneiforme, alguns em dois idiomas: sumério e acádio. Eram hinos, poemas, contratos e textos sobre geografia, matemática, medicina, religião, astronomia, leis, presságios, relatos de viagens e aventuras.


Os feitos de Gilgamesh, rei de Uruk, na antiga Mesopotâmia, foram cantados por dois mil anos até que, em 612 a.C., um grande incêndio devastou a biblioteca. O nome de Gilgamesh foi sendo pouco a pouco esquecido até desaparecer completamente. Desapareceram, também, os registros das sociedades que povoaram a Mesopotâmia e regiões vizinhas e com eles o passado do Oriente Próximo.


A cidade suméria de Uruk, fundada por volta de 3.500 a.C., foi uma das primeiras cidades da história e exerceu forte influência na cultura, urbanização e formação do Estado na região mesopotâmica. O poema menciona suas muralhas, templos e mercados – o que foi confirmado pela arqueologia.


A descoberta pelos arqueólogos


Em 1849, o arqueólogo britânico Austen Harry Layard, foi responsável por uma escavação ocorrida na região onde ficava a antiga cidade assíria de Nínive. Nela foram encontradas cerca de 30.000 placas de argila com escrita cuneiforme. Eram fragmentos que formavam 1.200 textos distintos da Biblioteca de Nínive. Entre eles as doze tábuas de argila contendo, cada uma, cerca de 300 versos da Epopeia de Gilgamesh. Historiadores, no entanto, consideram apenas as onze primeiras placas porque a última contém uma versão sintética da história que contradiz as inscrições das placas anteriores.


Segundo a Biblioteca Britannica, o texto existente mais completo da Epopeia de Gilgamesh está em doze tabuletas incompletas, em língua acadiana, encontradas em meados do século XIX por Hormuzd Rassam, especialista em Assíria, na biblioteca do rei assírio Assurbanipal. As lacunas que ocorrem nas placas foram parcialmente preenchidas por vários fragmentos encontrados em outras partes da Mesopotâmia e da Anatólia. Além disso, cinco poemas curtos na língua suméria são conhecidos a partir de tabuletas que foram escritas durante a primeira metade do segundo milênio a.C.; os poemas foram intitulados:


  • Gilgamesh e Huwawa

  • Gilgamesh e o Touro do Céu

  • Gilgamesh e Agga de Kish

  • Gilgamesh, Enkidu e o Mundo Inferior

  • A Morte de Gilgamesh


Tradução das placas


Todo o material descoberto foi enviado para o Museu Britânico, em Londres. A tradução ficou sob responsabilidade de Henry Rawlinson, especialista na escrita cuneiforme, auxiliado por George Smith. A tradução só foi possível graças à Inscrição de Dario, uma declaração de Dario I, que governou o Império Aquemênida de 521 a 486 a.C., escrita três vezes em três caracteres cuneiformes e alfabetos e línguas diferentes: duas línguas lado a lado, persa antigo e elamita, e babilônio acima delas.


A obra tinha sido escrita pelos sumérios com o nome de Sha-naqba-imru (Aquele que viu a profundeza) ou Shutur-eli-sham (Aquele que se eleva sobre todos os reis). Posteriormente o original foi transcrito a mando do rei assírio Assurbanípal (668 a.C. - 627 a.C.) e guardado na Biblioteca de Nínive. Pesquisas mostram que, a partir dela, foram feitas diversas traduções e adaptações nos idiomas hitita e hurrita, em diferentes locais como Nippur, Uruk e em Hattusa, antiga capital hitita.


A primeira versão do Gênesis?


Em 1872, diante de uma plateia de especialistas, George Smith leu a décima primeira placa que narrava um dilúvio devastador do qual somente um homem sobreviveu. A revelação causou impacto entre especialistas, teólogos e o público leigo. Mais surpresas vieram com a decifração de outras placas: Araru, a deusa criadora do homem, o mito Enuma elish, o poema da criação, e o mito de Adapa, o homem que recusou a imortalidade, personagem que, para alguns estudiosos, seria o Adão bíblico.


O impacto dessas descobertas desafiava a erudição literária e bíblica. A Epopeia de Gilgamesh já circulava por volta de 2.100 a.C., mas era muito anterior a ela. Diante dessa datação, todas as literaturas consideradas até então, como as primeiras da história, eram bem mais recentes.


As narrativas do Pentateuco ou Torá, a parte mais antiga do Velho Testamento, são do primeiro milênio a.C. A versão hebraica da Bíblia teria sido redigida entre os séculos VIII e V a.C., principalmente no tempo do rei Josias (640-609 a.C.). Por sua vez, os poemas épicos Ilíada e Odisseia, atribuídos a Homero, remontam aos séculos IX e VIII a.C.



Muito já se pesquisou e escreveu sobre a influência da Epopeia de Gilgamesh sobre a escrita do Gênesis chegando a se questionar a veracidade dos textos bíblicos. Por outro lado, a epopeia que chegou a nós também não é original, mas um compilado de lendas e poemas onde se misturaram tradições culturais de sumérios, acádios, assírios e babilônicos.


Foram encontradas cópias do poema em regiões diversas da antiga Mesopotâmia, da Palestina e da Turquia, e nem todas as versões coincidem. Enfim, tanto a Epopeia de Gilgamesh quanto o livro do Gênesis poderiam ter sido influenciados por histórias ainda mais antigas e difundidas no Oriente. Como lembra Fernand Braudel: O passado das civilizações nada mais é que a história dos empréstimos que elas fizeram umas às outras ao longo dos séculos…


A busca


Oh Gilgamesh, onde você está vagando? A vida que você procura, você nunca encontrará. (comprimido Sippar, I.2')


A pessoa responsável por reunir e adaptar as antigas histórias sumérias em um conto épico contínuo deve ter sido, sem dúvida, um escriba experiente, embora quem seja esse sábio em particular seja outro dos grandes mistérios que cercam essa obra magistral. A tradição mesopotâmica teve seu próprio candidato, e atribuiu a fixação de uma narrativa completa, denominada Sha naqba imuru, (Aquele que viu o Profundo), sem dúvida um nome dotado de grande significado e que vem da frase que inicia a Epopeia a um certo Sîn-leqi-unninni, um sacerdote, exorcista e escriba de Uruk no período da Babilônia Média (ca. 1600-1000 a.C.) que talvez tenha vivido entre os séculos XIII e XI a.C.


Embora seja tentador aceitar essa ideia, é um tanto improvável, dado que existem fragmentos do antigo Gilgamesh acadiano datado da Antiga Babilônia (ca. 2000-1600 a.C.), entre outros, as tábuas da Pensilvânia, Yale e Nippur com datas por volta de 1700 a.C., embora também seja verdade que essas versões incompletas não têm o prólogo e talvez nem o relato do Dilúvio, por isso não se pode descartar que o estudioso de Uruk tenha editado o texto paleobabilônico até lhe dar sua forma final.


Primeiro poema heroico complexo e extenso


A Epopeia de Gilgamesh é, sem dúvida, um dos escritos mais importantes da história, o primeiro verdadeiramente complexo e extenso. Mas é também, sobretudo, a primeira grande história que conhecemos. Certamente, antes do bravo rei sumério, existiram muitos outros heróis que realizaram grandes feitos, reais ou fictícios, sem dúvida exagerados e muitas vezes temperados com uma boa dose de imaginação e entusiasmo, porque o ser humano precisa de modelos inspiradores naqueles que veem suas próprias conquistas e fracassos refletidos.


Como a conhecemos hoje, é uma obra incompleta; um quebra-cabeça que está faltando peças porque foram perdidas, mas continuam ainda sendo procuradas. Apesar de tudo, existem apenas alguns detalhes complementares que preenchem as lacunas em certas partes da história, e ao estudá-la com cuidado é fácil chegar à conclusão de que sua mensagem, sua intenção mais primária, está de fato perfeitamente delineada. É então que brilha a verdadeira dimensão de uma história épica, uma viagem transcendental que coloca o leitor no papel de protagonista; alguém que, pela sua experiência, nos ensina até onde podemos ir como seres humanos e onde estão os nossos limites.



A narrativa da epopeia


A narrativa da Epopeia de Gilgamesh conta os eventos de Gilgamesh, quinto rei da primeira dinastia de Uruk, de acordo com a Lista Real Sumeriana. Segundo essa lista, seu reinado sobre Uruk foi de 126 anos. Ele aparece no poema como filho da deusa Ninsuna. Esse rei sumério existiu e viveu, provavelmente, no período entre 2800 a.C. e 2500 a.C. Embora a figura de Gilgamesh pareça corresponder à de um rei real, sua vida e seus feitos se misturam com elementos fantásticos e referências mitológicas ao longo de todo o texto. É considerado o mais ilustre antecessor dos reis sumérios, objeto de lendas e poemas e venerado como um herói que, ao longo do tempo, foi sendo divinizado.


Parte 1 - o combate entre Gilgamesh e Enkidu


Placa I – a história começa na cidade de Uruk, um antigo assentamento da Mesopotâmia localizado na margem ocidental do rio Eufrates (no atual Iraque). O poema escrito tem início com uma exaltação a Gilgamesh destacando suas virtudes, sua constituição (dois terços divinos e um terço humano) e seus feitos, as muralhas de Uruk e o templo de Eanna. O rei é imbatível e arrogante. Embora reconheça sua competência, a população está insatisfeita com sua prepotência e luxúria.


Os habitantes de Uruk rogam à deusa Aruru para criar um ser igual a Gilgamesh e que possa desafiá-lo. Aruru pega um pouco de barro e cria Enkidu, um homem selvagem coberto de pelo com cabelos longos e desgrenhados. Enkidu passa a viver na floresta com os animais.


Placa II – Gilgamesh toma conhecimento da existência de Enkidu e manda Shamhat, uma cortesã sagrada, para seduzi-lo e transformá-lo num homem civilizado. A mulher, cujo nome significa “a alegre”, corta os cabelos de Enkidu, raspa seus pelos, veste-o e ensina-o a comer pão e a tomar vinho. Depois vão para Uruk, ao encontro de Gilgamesh.


Ao se verem, os dois se estranham, medem força e lutam ferozmente. Enkidu faz Gilgamesh ajoelhar-se ou perder o equilíbrio e cair. Em outra interpretação, Gilgamesh acaba derrubando Enkidu. Seja como for, a luta termina empatada, os dois se abraçam e selam sua amizade, mas, nos textos sumérios, Enkidu é o servo.


Parte 2 - feitos de Gilgamesh e Enkidu


Placas III e IV – os dois vão para uma floresta de cedros e enfrentam Huwawa (Humbaba), um gigante feroz e temível que vomita fogo. Os dois matam o monstro e cortam a sua cabeça. Gilgamesh volta ao palácio, se lava e coloca sua melhor roupa.


Placa VI – a beleza dele atrai a deusa Isthar que se apaixona e promete a ele presentes magníficos, poderes e a divinização. Ele recusa o casamento e afirma que ela abandona os amantes depois de esgotá-los.


Placa VII – Ishtar se vinga, enviando um gigantesco touro celeste para destruir o herói e seu palácio. O touro, contudo, é derrotado por Gilgamesh e Enkidu. Como punição, ela amaldiçoa Gilgamesh e provoca uma doença fatal em Enkidu que passa doze dias em sofrimento.


Placa VIII – antes de morrer, Enkidu sonha com a “casa do pó” que o espera. Narra o lamento de Gilgamesh por seu amigo e o funeral de estado de Enkidu.


Parte 3 – a busca da imortalidade


Placas IX e X – Gilgamesh, tomado de pânico ao pensar que também um dia morreria, sai à procura de Utnapishtim, único sobrevivente do Dilúvio da Babilônia, que vive nos confins do mundo gozando o dom da imortalidade. Gilgamesh pergunta como alcançar a imortalidade. Utnapishtim conta como foi o dilúvio, mas nada revela sobre a imortalidade.


Placa XI – a mulher de Utnapishtim, compadecida com o fracasso do herói, revela que o segredo da imortalidade está no fundo do mar, na forma de uma planta maravilhosa. Se ele comer essa planta será eternamente jovem e imortal. Depois disso, Gilgamesh amarra pedras nos pés, mergulha no mar profundo e encontra a planta mágica. Ao arrancá-la, ele fere as mãos, mas consegue trazê-la à superfície. Decide, então, dividir a planta com os anciãos de Uruk.


No caminho de volta a Uruk ele interrompe a caminhada para descansar. Deita-se e logo adormece. Uma serpente sente o cheiro da flor e se apossa dela. Ao comer a flor a serpente muda de pele e rejuvenesce. Gilgamesh retorna decepcionado a Uruk e volta a admirar suas muralhas e construções.


Placa XII um apêndice relata a perda de objetos chamados pukku e mikku (talvez “tambor” e “baqueta”) dados a Gilgamesh por Ishtar. O espírito de Enkidu retorna, faz um relato sombrio sobre o submundo e promete recuperar os objetos. O poema termina com a morte de Gilgamesh.


O destino decretado por Enlil, o pai dos deuses foi cumprido. (…) Os heróis e os sábios, como a lua nova, têm seus períodos de ascensão e declínio. Foi-te dado um trono, reinar era teu destino; a vida eterna não era o teu destino. Assim não fiques triste, não te atormentes. Ele te concedeu supremacia sobre o povo, vitória nas batalhas (…). Mas não abuses deste poder; procede com justiça com teus servos no palácio, faze justiça ante a face do Sol. OLIVEIRA (trad.): 2001.


Os temas e as reflexões da epopeia


A Epopeia de Gilgamesh narra de forma brilhante uma viagem ao mundo interior de um personagem complexo que, por ser rei e filho de uma deusa, não deixou de ser vítima das incertezas e fragilidades humanas. Sua história geralmente se passa no espaço liminar que separa três áreas bem diferenciadas: a natureza, personificada pelo selvagem Enkidu e Humbaba, o guardião da floresta de cedro; a civilização, cujo expoente máximo é representado pelo próprio Gilgamesh e pela cidade de Uruk; e o sobrenatural ou divino, que é personificado pelos deuses e pelos seres temíveis que o herói enfrenta.


A morte de Enkidu na placa VII, e com ela a consciência de Gilgamesh de que ele próprio não conseguirá escapar do ceifador, atua como uma dobradiça entre as duas grandes buscas em espaços inóspitos. Sua segunda viagem, de fato, terminará com a aceitação de seu destino. A Epopeia de Gilgamesh mostra que as questões fundamentais da existência humana acompanham o homem há milhares de anos.

Gilgamesh é o modelo de herói em transformação, com virtudes e defeitos humanos, que se arrisca ao novo, desconhecido e extraordinário e, com isso provoca profundas mudanças. A jornada do herói é a da transformação interior.


No início do poema, a exaltação a Gilgamesh diz respeito à pessoa que ele se tornou ao final de sua jornada – “o sábio que viu os mistérios e conheceu coisas secretas”. A arrogância, truculência e luxúria de Gilgamesh são contestadas pelos habitantes de Uruk. Eles reclamam aos deuses, pois entendem que o líder deveria trabalhar para a harmonia da sociedade e não para provocar a discórdia. Clamam por justiça e pelo fim da opressão.


A criação de Enkidu traz elementos intrigantes. Ele é criado pela deusa Aruru a partir do barro – diferente da tradição hebraico-judaica que se refere a um deus criador masculino. Como Adão, ele vive entre os animais e em harmonia com eles. Quem vai mudar esse cenário é uma mulher, a cortesã sagrada Shamhat.


O papel de Shamhat é fundamental. Ela usa sua beleza e sedução para atrair o selvagem Enkidu. Com suas relações sexuais contínuas, ensina a ele os fundamentos da vida civilizada. As habilidades sexuais de Shamhat estabelecem a diferença entre o sexo para procriação – impulso próprio dos animais – e a sensualidade artística e sofisticada própria da civilização. Os mesopotâmicos consideram a prostituição como uma das características básicas da vida urbana e civilizada. Compreendem o papel de Shamhat em apresentar para Enkidu o mundo sedutor, mas complexo da cultura humana.


Depois de deitar-se com Shamhat seis dias e sete noites, Enkidu tenta voltar à vida selvagem, mas os animais fogem dele. Assim como Adão que, ao provar o fruto do conhecimento oferecido por Eva, foi expulso do paraíso, Enkidu não é mais o mesmo depois do aprendizado dado pela mulher. A conexão do homem selvagem com o mundo natural foi rompida. Ele volta à cidade, o lugar onde esse conhecimento pode ser usado.



Prestes a morrer, Enkidu expressa sua raiva contra Shamhat por trazê-lo ao mundo de experiências que o levou à morte. Ele a amaldiçoa. Porém, o deus Shamash (o Sol), lembra a Enkidu que foi Shamhat quem o alimentou e vestiu. Enkidu cede e abençoa a jovem, dizendo que todos os homens a desejarão e lhe oferecerão joias de presente.


O encontro de Enkidu e Gilgamesh


O encontro de Enkidu e Gilgamesh é outro momento chave da epopeia. Os dois são iguais, mas não idênticos. Eles têm a mesma força física e arrogância, mas diferentes experiências humanas. Sem família, Enkidu é afinado com o mundo natural e selvagem. Gilgamesh tem pai e mãe, vive e governa uma grande cidade. Representam a polaridade entre natureza e cultura. Enkidu é o agente das mudanças de Gilgamesh, inclusive na morte, ponto de virada na jornada do rei. O selvagem trará a Gilgamseh a oportunidade de se perceber humano, como todos os outros, e deixar de lado sua arrogância e sua recusa em aceitar o destino humano.


A relação fraternal entre eles nasce de suas diferenças sobre as quais se equilibram. Talvez esse seja o sentido mais profundo da luta inconclusa entre eles, sem vencedor e sem vencido. Eles foram criados para equilibrar um ao outro, um compensando o que falta no outro. A amizade deles se constrói na disputa, na escuta, na perda, no ganho, na cooperação, nos ciúmes, na vaidade, na lealdade, na coragem, na agressividade e na amorosidade.


Visão junguiana da relação Enkidu-Gilgamesh


A psicologia analítica ou junguiana (iniciada por Carl Gustav Jung) vê em Enkidu o irmão-sombra de Gilgamesh, sua “criança interior”, frágil e vulnerável (ou mesmo desprezada e humilhada). Para silenciá-la, o indivíduo desafia-se continuamente a provar sua grandeza, poder e força. Por trás desse comportamento está a sociedade patriarcal, com suas imposições de sucesso e desempenho, seu desprezo pelos semelhantes, pela mulher, pelos animais e pelo meio ambiente. Daí a arrogância, a intolerância, a vaidade desmedida e a intransigência.


A busca da imortalidade


Coube a uma mulher fornecer a chave do segredo a Gilgamesh. Ela fala sobre a planta capaz de dar a eterna juventude a quem a comer. De posse da planta, Gilgamesh tomado de compaixão (já não é mais o rei arrogante) decide levá-la a Uruk e dividi-la com os anciãos da cidade. Porém, uma serpente come a planta roubando a imortalidade do homem.


Impossível não fazer uma analogia com a serpente do Gênesis que tirou a vida eterna de Adão e Eva e levou-os à expulsão do Éden. Chegando a Uruk, Gilgamesh comenta com o barqueiro que o acompanha sobre a beleza e imponência da cidade, feita de tijolos cozidos, com suas muralhas, templos e jardins.


Os versos anunciam: “Tudo isso era obra de Gilgamesh, o rei que conheceu os países do mundo. Ele era o sábio, viu os mistérios e conheceu as coisas secretas. Transmitiu-nos uma história dos dias antes do dilúvio. Fez uma longa jornada, conheceu o cansaço, esgotou-se em trabalhos e, ao regressar, gravou numa pedra toda a história.” (TAMEN, 1992, p. 89-90). Essa era a imortalidade tão desejada por Gilgamesh, suas obras, a sabedoria alcançada e sua história transmitida às gerações futuras. Tudo o que realmente fica para a eternidade.


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