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Huzama Habayeb - A escritora fiel à identidade palestina

campusaraujo

Atualizado: 18 de fev.


Seu constante desafio ao sionismo

Huzama Habayeb (حزامة حبايب), escritora, romancista, colunista, tradutora e poeta palestina nasceu no Kuwait, em 4 de junho de 1965. Em 1987, obteve a licenciatura em língua inglesa e literatura pela Universidade do Kuwait. É membro da Associação de Escritores da Jordânia e da Federação de Escritores Árabes. Quando eclodiu a Guerra do Golfo, em 1990, ela e seus familiares mudaram-se para a Jordânia. Hoje ela vive nos Emirados Árabes Unidos. Segundo Huzama, o fato de ser uma refugiada palestina de segunda geração, com todo o excesso de bagagem que isso traz, adicionou um elemento complexo, pois ela não pôde deixar de se debruçar sobre sentimentos de desconforto, tremor, desenraizamento e a sensação de não pertencimento.

Escrever, de certa forma, me salvou dos meus próprios demônios

Escrever sempre foi uma maneira de eu procurar respostas para perguntas ardentes dentro de mim, apenas para acabar na maioria das vezes com mais perguntas sem respostas. Perguntas que gerariam mais perguntas, ao que parece. Hoje, depois de todos esses anos, posso te dizer que escrever, de certa forma me salvou, me salvou dos meus próprios demônios. Tornou o mundo ao meu redor mais tolerável. Não que eu o entenda melhor ou entenda a mim mesma. Pelo menos, estou menos perdida do que antes. Nesse sentido, escrever é um processo constante de tentar, tentar saber, tentar descobrir.

 Huzama é uma refugiada palestina de segunda geração. Seu pai e sua família cresceram nos acampamentos espalhados ao redor da Jordânia, onde ela passava os verões com seus primos. Como palestina de classe média que cresceu no Kuwait, sua vida não era tão diferente de quando ela e sua família viviam na Jordânia. "Viviamos apertados em um pequeno apartamento com uma renda escassa. Às vezes, mal conseguíamos sobreviver. Para ambas as famílias da zona da diáspora, cada dia de vida era uma tentativa de sobrevivência. A identidade palestina criou uma consciência coletiva que era como um fio que conectava os palestinos à diáspora."

Conflito entre Israel e Palestina

Sionismo - movimento político e nacionalista judaico que surgiu no final do século XIX. Defende a criação e manutenção de um Estado judeu na terra de Israel. Impulsionado pelo antissemitismo e pelo desejo de autodeterminação, resultou na fundação de Israel em 1948. Possui diversas correntes, desde religiosas até seculares e socialistas.

Israel - judeus são aqueles que seguem a religião judaica. Sionistas são aqueles judeus que defendem a manutenção do Estado de Israel. Para alguns judeus a existência de um Estado não é essencial para a manutenção das tradições e religiosidades do judaísmo. Muitos deles não defendem as violências cometidas pelo Estado de Israel contra os palestinos. Em hebraico a palavra Israel significa vencedor de Deus, de israea (venceu) e Iel (Deus).

Nakba ou "catástrofe" - refere-se ao êxodo massivo e à expulsão de centenas de milhares de palestinos durante a criação do Estado de Israel em 1948. Marcada pela perda de lares, terras e identidade, esse evento provocou um deslocamento forçado e consolidou um conflito que perdura e alimenta tensões e disputas territoriais entre israelenses e palestinos persistentes na região.

Palestina - representa a Judeia e a Canaã do mundo antigo. Os romanos se referiam a Síria e a Palestina que era a terra dos filisteus. A independência da Palestina foi declarada em 15 de novembro de 1988, pela Organização para a Libertação da Palestina (OLP) e por seu governo no exílio em Argel, na Argélia. Atualmente, os principais problemas que obstruem o acordo eles são a fronteiras, a segurança, os direitos marítimos, o status de Jerusalém e a liberdade de acesso aos locais religiosos, além, é claro a “guerra” de Israel contra Hamas na Faixa de Gaza.

Em quase todas as suas obras há uma adesão total à sua identidade palestina, presente em seus dois primeiros romances e nas histórias de suas quatro coleções. Isso também fica evidente em suas traduções, ao escolher livros cujo conteúdo revele a crise palestina e as políticas injustas adotadas por Israel contra os palestinos. Seu mais importante desafio ao sionismo foi uma campanha que ela lançou contra a publicação de uma antologia de contos de mulheres do Oriente Médio, organizada pela Universidade do Texas, em Austin. A inclusão de contos de dois autores israelenses foi o motivo que a levou a retirar o seu artigo. Em seguida, ela entrou em contato com todos os autores árabes e os convenceu a fazer o mesmo. A campanha foi bem-sucedida, pois a maioria dos autores retirou seus manuscritos, obrigando a instituição a cancelar a publicação.

Plano de Partilha da Palestina

O Plano de Partilha da Palestina foi uma proposta das Nações Unidas, apresentada em 1947, para dividir o mandato britânico na região em dois estados: um judeu e um árabe, com Jerusalém sob administração internacional. A proposta visava resolver conflitos entre comunidades judaicas e árabes na região, buscando estabelecer coexistência pacífica. Embora aceita pela liderança sionista, foi rejeitada pela maioria árabe, que considerava injusta a divisão de terras historicamente habitadas. O plano precipitou tensões, levando à Guerra Árabe-Israelense de 1948, que resultou na criação do Estado de Israel e no início do deslocamento massivo de palestinos e intensificaram o embate.

Após a realização de acordos entre Estados Unidos, Reino Unido e reunião Soviética, a ONU realizou a partilha da Palestina em 1947. Os judeus ficaram com 57% do território e os árabes, que eram maioria na região, com 43%.

Em 9 de Abril de 1948, segundo o The New York Times, bandos terroristas (sionistas) atacam a aldeia palestina, que no decorrer dos combates não representava nenhum objetivo militar, e matam a maioria da sua população - 240 homens, mulheres e crianças; deixam uns poucos com vida para fazer fazê-los como prisioneiros em Jerusalém. Muitos afirmam ter sido um genocídio seguido de expulsão em massa de palestinos que hoje estão confinados na Cisjordânia e na Faixa de Gaza. Começa, então a Diáspora Palestina e os conflitos que duram até hoje.

Habayeb justificou suas ações em um editorial publicado no Gulf News dos Emirados Árabes Unidos, em 25 de maio de 2012: "Não posso aceitar, ética e moralmente, que minha voz seja compartilhada igualmente com escritores que refletem a voz de um ocupante repugnante..." Ela considera que, por ser romancista palestina, é importante não escrever alegorias políticas e sim personagens reais e totalmente dimensionais. “Eu não escrevo política. A questão palestina para mim é mais das pessoas – aquelas esquecidas – cujas histórias, dores e sofrimentos não contados precisam ser desvendados”.


Velvet, o premiado romance em árabe

Velvet (Veludo), romance Mujmal (resumo) publicado pela Hoopoe Fiction (AUC Press, Cairo 2019) e ganhador da Medalha Naguib Mahfouz de Literatura de 2017, mostra o intrigante reino dos campos palestinos de uma maneira sem remorso, profunda e brutalmente honesta. Em meio ao ambiente hostil e áspero do campo de refugiados de Baqa'a, na Jordânia, Hawwa (o equivalente a Eva), aprendiz de costureira palestina passa as mãos por rolos de veludo. Mãos que falam de um espírito decadente e até agora só testemunham a perda coletiva do passado. Hawwa consegue sobreviver ao próprio campo de refugiados, bem como à humilhação e à destruição de uma vida familiar ultrajante. A história é narrada com uma sensibilidade particular relacionada ao mundo sensual, embora trágico, da personagem e, sobretudo, em relação ao seu desafio perturbador e heroico da realidade. A dureza do cotidiano de Hawwa contrasta radicalmente com a suavidade do material em torno do qual gira seu mundo. De certa forma, o romance é um estudo sobre a claustrofobia decorrente da pobreza e da opressão, de cotidianos despidos de qualquer tipo de ternura, do jugo familiar e do patriarcado. É a história de uma mulher prodigiosa que luta para sobreviver e amar e que revive a si mesma cada vez que é despedaçada e perseverantemente cumpre seus desejos, apesar de ser implacavelmente esmagada pela sociedade. Hawwa encontra sua fuga da dura vida cotidiana no campo e de um marido que, como seu pai, bate nela regularmente.

Significado de Mujamal

Mujmal (مجمل) é um termo árabe que significa "resumido", "conciso" ou "abrangente". Em contextos islâmicos e jurídicos, refere-se a textos ou expressões que possuem significado geral, exigindo interpretação para maior clareza. No estudo do fiqh (jurisprudência islâmica), um termo mujmal pode necessitar de explicação detalhada (bayan) para ser plenamente compreendido. Em gramática e retórica árabe, é usado para descrever frases sintéticas que podem ser posteriormente detalhadas. O conceito também aparece em literatura e filosofia islâmica, indicando ideias ou passagens que requerem esclarecimento para interpretação precisa. Assim, mujmal representa algo essencial, mas que demanda maior explicação.

Fé Mujmal (Iman Mujmal) é a fé concisa e resumida no Islã, baseada na crença fundamental em Allah, Seus profetas, livros e o Dia do Juízo. Diferente da fé Mufassal (detalhada), a Mujmal enfatiza a essência da crença sem explicações extensas, sendo suficiente para a aceitação do Islã por um novo muçulmano.

Fé Mufassal (Iman Mufassal) é a fé detalhada no Islã, abrangendo a crença em Allah, Seus anjos, livros, profetas, o Dia do Juízo, o destino divino e a ressurreição. Diferente da fé Mujmal (resumida), a Mufassal especifica cada elemento da crença islâmica, aprofundando a compreensão e compromisso do muçulmano com sua fé.

Velvet é tecido com as próprias memórias de Huzama, do tempo que ela passou com sua família. Enquanto escrevia, ela mantinha pedaços de tecido que havia comprado nos souqs fora do campo e estudava as fotografias que havia tirado lá como parte de sua pesquisa.

A premiada tradução de Velvet para o inglês


A tradutora Kay Heikkinen,PhD pela Universidade de Harvard e pelo Ibn Rushd Lecturer of Arabic na University of Chicago, ganhou o Prêmio Saif Ghobash Banipal 2020 de Tradução Literária Árabe por converter do árabe para o inglês o romance Velvet, de Huzama Habayeb.


É um prêmio concedido anualmente aos tradutores de uma obra publicada em inglês a partir de outra inteiramente em árabe e de reconhecido mérito literário. Administrado pela Society of Authors of the United Kingdom, tem como objetivo aumentar a notoriedade da literatura árabe contemporânea, estabelecido pela Banipal, a revista de literatura árabe moderna e pela Fundação Banipal para Literatura Árabe.


O júri ficou impressionado com a forma como a tradução de Kay consegue transmitir não apenas o significado, mas também o tom e a emoção do texto original, dando vida a uma narrativa que descreve profusamente a vida reprimida da mulher palestina comum, evitando, é claro, mencionar qualquer tipo de clichê político. A história “é contada em um árabe rico e cuidadosamente elaborado que representa um desafio significativo para qualquer tradutor, exigindo resistência e resiliência, além de exatidão e precisão”.

Velvet

Velvet narra a vida de Hawwa, uma mulher palestina crescida em um campo de refugiados na Jordânia. Criada em um ambiente abusivo, encontra refúgio na costura, que aprende com Sitt Qamar, que a ensina tanto a arte da alfaiataria quanto o valor próprio. Em meio a desafios, busca construir uma vida digna, enfrentando opressão, amor e perda. O romance destaca a superação das mulheres palestinas e a luta por identidade no exílio. Com uma escrita rica em detalhes sensoriais, Habayeb oferece uma imersão profunda na jornada de Hawwa.

 

Ela traduzia como se estivesse costurando um vestido ou fazendo algum tipo de bordado. Eu diria que Kay abraçou o mundo de Velvet e conseguiu reproduzir habilmente o lirismo, o sentimento geral e a vibração da narrativa de uma maneira que superou as disparidades culturais e linguísticas entre o árabe e o inglês. Huzama Habayeb.

Conto, poesia, romance e não ficção


Conto

Em 1992, ela recebeu o Jerusalem Festival of Youth Innovation in Short Stories seu primeiro prêmio de escrita com a coleção de contos O homem que recorre ( الرَّجُل الذي يَتَكرَّر) publicado pelo Arab Institute for Research and Publications (AIRP), editora que mais publica suas obras.

Em 1994, ela recebeu o Mahmoud Seif Eddin Al-Erani, seu segundo prêmio com a coleção de contos As maçãs distantes (التُفَّاحات البَعيدَة) concedido pela Al-Karmel Publishing House—Jordanian Writers Association.

Uma forma de ausência (شَكْلٌ للغِياب), sua terceira coleção de contos, publicada pela AIRP, em 1997, foi um ponto de inflexão, ou seja, um momento no qual houve uma mudança na técnica de escrita de Habayeb. Em uma entrevista na TV Al Jazeera, em 4 de maio de 2004, ela explicou que todas as personagens femininas das diferentes histórias poderiam ser a mesma pessoa; todas aquelas pessoas sentiram como se "pertencessem a uma só mulher.

Noite doce (لَيْلٌ أحْلَى), lançado em 2002 também pela AIRP— foi a quarta e última coleção de contos que Habayeb publicou antes de fazer a transição para o romance. Uma resenha publicada em 1º de fevereiro de 2002 no Al-Hayat, jornal de Londres, elogiou a coleção dizendo que "ela desenterra os mesmos lugares que suas histórias costumam abordar, mas a escavação nesta nova coleção é mais profunda, mais distante, mais rica e mais ousada do que nunca.


Poesia

Em maio de 1990, ela publicou uma coleção de quatorze poemas em versos livres intitulada Imagens, na edição 23 da revista An-Naqid, sediada em Londres. Sua obra poética intitulada Mendicância é a mais notável coleção de poesia publicada em 2009 pelo AIRP.

Romance

2007 – A Origem do Amor (Asl al-hawa), aclamado pela crítica.

2011 – Antes que a rainha adormeça (Qabla an tanama al-malika), que os críticos descreveram como um romance épico da diáspora palestina.

2016 – Velvet (Mujmal) primeira edição em árabe publicada. Em dezembro de 2017 obteve a Medalha Naguib Mahfuz de Literatura.

A Origem do Amor (أصْل الهَوَى) causou uma tempestade de controvérsias devido à abundância de conteúdo sexual; apresentado tanto por meio de insinuações quanto explicitamente. O romance foi banido na Jordânia, onde foi impresso, por ordem do Departamento de Imprensa e Publicações.

O romancista e crítico literário palestino Waleed Abu Bakr escreveu um artigo crítico sobre o romance A Origem do Amor, em agosto de 2007, no qual o descreveu como "um romance sério e significativo em termos de técnicas de contar histórias ou a importância dos temas cruciais. Todas as cenas de sexo ricas e bem estruturadas não se destinam apenas a despertar – o que é algo que o leitor pode sentir sem suspeita devido à ausência de erotismo em sua forma clichê e vulgar – mas para alcançar a igualdade de gênero".

A Origem do Amor, banido na Jordânia

A Origem do Amor (أصل الهوى), romance da escritora palestina Huzama Habayeb, foi publicado em 2007 e gerou controvérsia devido ao seu conteúdo sexual explícito. Como resultado, o livro foi proibido na Jordânia, onde havia sido impresso, por decisão do Departamento de Imprensa e Publicações. Em entrevista ao jornal Al Ghad em 2008, Habayeb expressou que a retórica midiática proclama apoio às liberdades públicas, incluindo a liberdade de expressão, mas a realidade demonstra uma falta de tolerância intelectual e a imposição de restrições ao pensamento e à escrita.

 Antes que a rainha adormeça (قَبْلَ أن تَنامَ المَلِكَة) é um romance que mergulha nas profundezas da humanidade palestina e oferece uma narrativa dos pecados cometidos pelos desonestos. A realidade árabe contra os palestinos: pecados que degradam a humanidade dessa realidade e aumentam a força dos palestinos e a nobreza de sua posição. Por ser autora de uma geração que não nasceu na Palestina, sua escrita assume um significado exacerbado que enfatiza a direita palestina e seu entrincheiramento no conhecimento. É um romance que descreve a mulher palestina como nunca foi escrito de forma tão eficaz e profunda, e sem qualquer sentimento emocional.


Não-ficção


Habayeb escreveu para vários jornais e revistas diários, como Al Ra'i, Ad-Dustour, Doha Magazine, Al-Qafilah Magazine e Dubai Al-Thakafiya, revista mensal na qual atualmente tem sua própria coluna. Ela aborda vários temas em suas obras de não-ficção – política, literatura, questões sociais, arte, antropologia e experiências pessoais.

Apesar de ser uma autora árabe cuja ficção publicada é escrita em árabe, Habayeb conseguiu desenvolver uma reputação internacional participando de vários eventos culturais que ocorreram fora do mundo árabe e também traduzindo algumas de suas obras para o inglês.

Em setembro de 2011, em Oslo – Noruega, ela participou do evento cultural Visualizando a Palestina, sobre literatura palestina. O evento incluiu palestras e leituras de seminários com vários autores palestinos. Em abril de 2012, ela participou de um evento cultural organizado pela Universidade de Estudos Estrangeiros de Hankuk, na Coreia do Sul. Participou de uma palestra sobre a discriminação a que os palestinos são submetidos nos estados árabes.

Algumas das histórias de Habayeb foram traduzidas para o inglês, o que ajudou o eco de sua voz literária a alcançar mais leitores em todo o mundo. A revista Banipal, com sede em Londres, publicou uma série de obras de Habayeb traduzidas para o inglês, como o conto Noite mais doce (لَيلٌ أحْلَى) da coleção de mesmo nome, e o décimo segundo capítulo do romance Antes que a rainha adormeça (قَبْلَ أنْ تَنَامَ المَلِكَة).

Ela também foi uma das autoras de Qissat, uma antologia de contos escritos por escritoras palestinas e publicada em 2006, com o conto Broches de linha (خَيْطٌ يَنْقَطِع) de sua quarta coleção de contos Noite mais doce ( لَيْلٌ أحْلَى)֎

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