
Florence Onyebuchi “Buchi” Emecheta comprometeu-se em corrigir os estereótipos da mulher nigeriana e africana, expondo sua realidade diária e a opressão das normas sociais.
Sua obra questiona, entre outros temas, a educação da mulher, a valorização da maternidade como única preocupação possível, a violência degradante do colonialismo e a cultura que deslegitima sua autonomia.
Cinco motivos para ler Buchi Emecheta
1 conhecer uma nova cultura - sua narrativa ágil e habilidosa expõe a Nigéria do Século XX e os efeitos da colonização britânica sobre o povo nigeriano. |
2 entender o conceito de assimilação - o assimilado era o colonizado que rejeitava a sua própria cultura em prol de uma cultura superior, em que ele, é diferente dos demais compatriotas, pretensamente fazia parte. |
3 ler sobre temas como racismo e xenofobia e violência doméstica - a literatura nos humaniza e desenvolve nossa capacidade de sentir empatia. |
4 refletir sobre a assistência social - o assistencialismo é um dos temas mais fortes em O fundo do poço. Talvez ele faça com que os leitores tenham um novo olhar em relação aos usuários de programas sociais, vendo-os como pessoas que realmente precisam de ajuda por algum tempo. |
5 ter uma olhar mais carinhoso em relação às mães - As alegrias da maternidade é um título bastante irônico. Você vai entender que ser mãe dói, e essa é uma dor ancestral. |
Literatura - sobre a arte da palavra, sobretudo escrita https://www.literaturablog.com/cinco-motivos-para-ler-buchi-emecheta/ |
Buchi nasceu em 1944, na cidade Yoruba de Lagos e passou boa parte da infância em Ibuza, terra de seus pais, Alice Ogbanje Emecheta e Jeremy Nwabudike Emecheta que foram buscar trabalho em Lagos, mas faziam questão de cultivar nos dois filhos as raízes Igbo.
Povo Iorubá
Iorubá é o nome de uma das maiores etnias populacionais do continente africano. Na verdade, o termo é aplicado a uma coleção de diversas populações ligadas entre si por uma língua comum de mesmo nome, histórias e cultura. Os grupos étnicos que vivem próximos aos Iorubás são os Fon, Ibo, Igala e Idoma.
A maior parte dos Iorubás vive na região sudoeste da Nigéria. Há também importantes comunidades presentes em Benim, Gana, Togo e Costa do Marfim. Devido ao tráfico de escravos, bastante ativo na área entre os séculos XV e XIX, muitos traços da cultura, língua, música e demais costumes foram disseminados por extensas regiões do continente americano, com destaque para Brasil, Cuba, Trinidad e Tobago e Haiti. Boa parte da população negra no Brasil veio de terras Iorubás.
Povo Iorubá |
Os Iorubás são um dos maiores grupos étnicos da África Ocidental, principalmente na Nigéria, Benin e Togo. Possuem uma rica tradição cultural, com mitos, arte e um sofisticado sistema religioso centrado no culto aos orixás, como Xangô, Oxum e Iemanjá. A cidade de Ifé é considerada sagrada, sendo berço da civilização iorubá. Sua estrutura social é organizada em cidades-estado, governadas por reis chamados obas. A diáspora iorubá influenciou religiões afro-americanas, como o candomblé e a santeria. A língua iorubá é tonal e desempenha papel fundamental na identidade do povo, transmitindo sua rica herança cultural e espiritual. |
Cultura Iorubá |
A cultura iorubá é rica em mitologia, arte e tradições religiosas. Sua estrutura social é organizada em cidades-estado governadas por obas (reis) e conselhos de anciãos. A religião iorubá reverencia Olodumarê, o deus supremo, e os orixás, como Xangô, Oxum e Iemanjá, mediadores entre humanos e o divino. A oralidade é essencial, preservando histórias e ensinamentos através de orikis (poemas elogiosos) e Ifá (sistema de adivinhação). A arte inclui esculturas em bronze e madeira, máscaras e tecidos vibrantes. Na diáspora, influenciou religiões como o candomblé e a santeria. Música e dança desempenham papel central em festivais e rituais. |
A história recente dos Iorubás é marcada pelo surgimento do Império de Oyo no final do século XV, que se ergueu com o auxílio dos portugueses interessados no comércio local. Lagos, aliás, a mais importante e populosa cidade da Nigéria, localizada em terras Iorubás, recebeu seu atual nome do entreposto construído pelos portugueses, uma referência à cidade do sul de Portugal.
No início do século XIX a invasão dos Fulani empurrou os Iorubás para o sul, onde as cidades de Ibadan e Abeokuta foram fundadas. A maior parte das áreas Iorubá são oficialmente colonizadas pelos britânicos a partir de 1901, sob um sistema de governo indireto que imitava as estruturas tradicionais.
Povo Igbo |
Os Igbos são um dos principais grupos étnicos da Nigéria, concentrados no sudeste do país. Conhecidos por sua cultura descentralizada, organizam-se em aldeias governadas por anciãos e sociedades secretas, sem uma autoridade centralizada. Sua religião tradicional reverencia forças espirituais e ancestrais, destacando a figura de Chukwu, o deus supremo. Os igbos têm forte tradição comercial e agrícola, sendo historicamente influentes no comércio regional. Durante a colonização britânica, enfrentaram mudanças sociopolíticas, e na década de 1960 tentaram formar a República de Biafra, resultando em uma guerra civil devastadora. Sua cultura sobrevive na língua igbo, na arte e nas tradições espirituais. |
Cultura Igbo |
A cultura Igbo é marcada por uma estrutura social descentralizada, baseada em aldeias governadas por anciãos e sociedades secretas. Sua religião tradicional reverencia Chukwu, o deus supremo, além de divindades menores e espíritos ancestrais. Ritmos musicais, máscaras esculpidas e festivais, como o New Yam Festival, são essenciais para sua identidade. A arte Igbo destaca esculturas em madeira e bronze, usadas em rituais e cerimônias. A literatura oral, rica em provérbios e mitos, preserva sua história. Apesar da colonização e da diáspora, os Igbos mantêm sua língua, tradições e valores, como a forte ênfase na educação e no empreendedorismo. |
Na Nigéria atual, os Iorubás são uma importante etnia, representando cerca de um sexto da população. São, na sua maioria católicos, mas uma parte segue também o islamismo e o culto tradicional. Cerca de 75% dos homens são agricultores que vivem daquilo que cultivam. As mulheres geralmente são encarregadas de vender parte do excedente nos mercados populares das cidades. Alguns indivíduos possuem grandes fazendas de cacau cujo trabalho é realizado por mão de obra contratada.
Além das autoridades formais, nas cidades, os Iorubás respeitam o “Oba”, líder temporal, que conquista sua posição de formas diferentes, incluindo herança, casamentos, ou por seleção pessoal do Oba no poder. Cada Oba é considerado um descendente direto do Oba fundador de cada cidade, geralmente auxiliado por um conselho de chefes.
Os trajes elaborados, feitos tradicionalmente de algodão, são um destaque da cultura Iorubá. O mais básico é a Aso-Oke, de várias cores e padrões diferentes. O agbada é um dos trajes masculinos típicos, cujo nome no Brasil virou sinônimo de uma espécie de uniforme de um determinado bloco de carnaval.
Povos Igbos
Os Igbos (pronuncia-se ibos) são um dos maiores grupos étnicos africanos. A maioria da população Igbo está concentrada na Nigéria, dominando parte do sul e oeste, com cerca de 25 milhões de habitantes. Encontram-se também em Camarões, Guiné Equatorial, Gana, Serra Leoa, Costa do Marfim, Gabão, Libéria e Senegal. Atualmente, milhares deles residem nos Estados Unidos. A tradição oral mais antiga afirma que sua presença, na chamada Terra dos Igbos, remonta há mais de 1500 anos.
As cidades soberanas dos Igbos
Muitas culturas da Nigéria não se transformaram em monarquias centralizadas. Dessas, os Igbos são provavelmente os mais notáveis devido ao tamanho do seu território e à densidade da sua população. As sociedades Igbo eram organizadas em aldeias autossuficientes, ou federações de comunidades de aldeias, com uma sociedade de anciãos e associações de grupos da mesma faixa etária que desempenhavam várias funções governamentais.
Em 1967, apoiados pela multinacional francesa Elf-Aquitaine, declaram a independência da região leste da Nigéria, formando a República de Biafra. Houve fome generalizada na região e guerra civil que levou à derrota dos Igbos.
Guerra de Biafra
A Nigéria se tornou independente em 1960 e foi formada pela reunião do povo Igbo com o povo Hausa. Os Igbos eram provenientes da província de Biafra, a leste do país, e formavam a elite da Nigéria. De uma forma geral eram os que tinham os melhores empregos e os melhores salários. Num golpe de Estado, em 1966, um grupo de oficiais do exército da etnia Igbo tomou o poder. No entanto, o novo governo foi derrubado por um contragolpe e os Igbos passaram a ser caçados e massacrados em todo o país.
Língua Igbo |
A língua igbo pertence à família nigero-congolesa e é falada por milhões de pessoas, principalmente no sudeste da Nigéria. É uma língua tonal, onde o significado das palavras pode mudar conforme a entonação. Possui diversos dialetos, mas há um igbo padronizado usado na educação e na mídia. A escrita igbo foi influenciada pelo alfabeto latino, introduzido por missionários no século XIX. A oralidade é essencial, transmitindo provérbios, mitos e histórias. Apesar da influência do inglês, o igbo continua sendo símbolo de identidade cultural. Esforços modernos buscam revitalizá-lo por meio da literatura, música, cinema e tecnologia. |
Os que conseguiram escapar fugiram para a sua província de origem e se declararam independentes. A Guerra de Biafra durou entre 1967 e 1970, com um total de 2 milhões de civis mortos, além de 4,5 milhões deslocados de suas próprias casas. No fim, Biafra não conseguiu a separação e foi reintegrada à Nigéria.
Pelé parou a guerra. Mito ou realidade?
Em 1969, o Santos viajou para uma excursão pelo continente africano. Na época, a Nigéria passava por uma guerra civil, com a região de Biafra tentando a independência.
Os guerrilheiros de Biafra já tinham tomado Benin, mas a cidade foi recuperada por tropas do governo e passou a ser protegida por grande aparato militar para que o Santos pudesse jogar lá em segurança. O governador do Estado de Bendel decretou feriado, o Coronel Samuel Ogbemudia liberou a ponte sobre o Rio Sapele, livrando o acesso para Benin e a população pôde apreciar Pelé e os outros astros negros dos Santos em suas imaculadas camisas brancas vencerem a seleção do meio-oeste por 2 a 1. A história do jogo do Santos, porém, nunca foi confirmada oficialmente.
“Um dos meus grandes orgulho foi ter parado uma guerra na Nigéria, em 1969 ,em uma das várias excursões que o Santos fez pelo mundo. Nós tínhamos um amistoso marcado na cidade de Benin, que estava no meio de uma guerra civil. Só que o Santos era tão amado que as partes aceitaram cessar-fogo no dia da partida. Ficou conhecido como o dia em que o Santos parou a guerra”. Pelé - 2020 |
Colonização da Nigéria
Os primeiros colonizadores que chegaram ao país foram os portugueses, por volta de 1470, sendo seguidos por outros países europeus. Ao longo do tempo, o predomínio da ocupação da Nigéria ficou a cargo dos ingleses, que assumiram o controle da maior parte da região, criando uma única colônia.
No contexto de uma sociedade de classes, era prática comum dos colonialistas angariar o apoio da burguesia e da classe média local, tratando-os como iguais. O assimilado era, portanto, o colonizado que rejeitava sua própria cultura em prol de uma cultura superior, em que ele, diferente dos demais compatriotas, pretensamente fazia parte.
Dialetos Igbo |
A língua igbo possui numerosos dialetos, variando conforme a região onde é falada. Os principais grupos dialetais incluem o owerri, onitsha, umuahia, nsukka e ndi anioma. Apesar dessas variações, há um igbo padronizado, desenvolvido a partir do dialeto owerri e adotado na educação e na comunicação oficial. Os dialetos compartilham uma base comum, mas diferem em pronúncia, vocabulário e gramática. A diversidade dialetal reflete a estrutura descentralizada do povo Igbo, com aldeias autônomas que preservam suas particularidades linguísticas. Esforços modernos buscam promover a padronização e a preservação do idioma, especialmente diante da crescente influência do inglês na Nigéria. |
Infância e Juventude
Quando menina, uma das suas paixões era ouvir histórias dos mais velhos. As contadoras, seguindo a tradição local, eram sempre mães de alguém. Ela cresceu ouvindo a tia, a quem chamava de Grande Mãe. Buchi costumava sentar “por horas a seus pés, hipnotizada pela sua voz de transe”, deleitando-se com as proezas de seus ancestrais. As visitas a Ibuza, aliadas ao prazer e ao conhecimento, obtidos com as narrativas, trouxeram a Emecheta a certeza de que ela também seria uma contadora de histórias.
Durante a infância, seu irmão, privilegiado por ser menino, foi para a escola, enquanto Buchi ficou em casa. Mais tarde, após diversos e insistentes pedidos, ela foi matriculada em uma escola missionária para meninas, onde aprendeu línguas nativas e o inglês – seu quarto idioma.
Buchi Emecheta viveu uma infância dura. No entanto, a pobreza e a subnutrição em seus anos de juventude, somadas à perda precoce de seu pai quando ela tinha apenas oito anos, não lhe diminuíram a vontade de viver, um desejo intenso que nunca a abandonaria.
Em 1954, Buchi recebeu uma bolsa de estudos em uma escola de elite, em Lagos. Nessa época, sua mãe faleceu e ela foi passada de um a outro parente distante. Nas férias escolares, enquanto suas colegas voltavam para as confortáveis casas das famílias, ela permanecia no dormitório da escola, encontrando abrigo nos livros e na imaginação. A volta das férias era seu momento de brilhar, deixando maravilhadas as colegas com histórias sobre supostas aventuras.
Arte igbo |
A arte igbo é diversa e profundamente espiritual, expressa crenças, identidade e status social. Suas esculturas em madeira representam ancestrais, divindades e figuras de poder, muitas vezes usadas em rituais. Máscaras ricamente detalhadas aparecem em festivais e cerimônias de iniciação, simbolizando espíritos e forças místicas. Os igbos também criam bronzes e terracotas que refletem sua história e mitologia. A arte corporal, como a pintura uli, decora corpos e paredes com padrões simbólicos. Tecelagem, cerâmica e adornos em miçangas complementam sua estética vibrante. Mesmo com influências externas, a arte igbo continua viva, preservada por artistas contemporâneos e nas tradições culturais. |
Casamento infeliz, abusivo e violento
Aos 11 anos, ela conheceu e se tornou noiva do estudante Sylvester Onwordi e, aos dezesseis, já estavam casados. Logo nos primeiros anos, nasceram dois dos cinco filhos. A família mudou-se para Londres e Onwordi foi para a universidade local.
Emecheta viveu um casamento infeliz e, não raro, abusivo e violento. Em seu tempo livre, ela começou a escrever e até já tinha desenvolvido o rascunho de um romance, que acabou sendo queimado pelo marido. Ele estava consumido por um absurdo sentimento de posse e se achava ameaçado pela força de vontade da esposa que sonhava conquistar uma graduação e tornar-se escritora.
Música igbo |
A música igbo é vibrante e essencial na vida cultural, religiosa e social do povo. Utiliza instrumentos tradicionais como udu (tambor de cerâmica), ekwe (tambor de fenda) e ogene (sino metálico). O ritmo é marcado por polirritmia e combinam diferentes padrões percussivos. Canções acompanham rituais, festivais, casamentos e celebrações da colheita, como o New Yam Festival. O canto responsorial, onde um líder canta e o coro responde, é comum. A música moderna igbo influenciou o highlife e o afropop, incorporando instrumentos ocidentais. Apesar das mudanças, a tradição musical igbo continua forte. Preserva sua identidade e conecta gerações. |
Buchi obteve o divórcio em 1966, aos vinte e dois anos. O ex-marido, porém, não reconheceu a paternidade dos filhos. Sem dinheiro, com cinco filhos para cuidar e em um país estranho a ela, manteve-se com obstinação. Trabalhou na Biblioteca de Londres, enquanto estudava à noite e começou a carreira de escritora conjugando a educação dos cinco filhos e os estudos na Universidade de Londres, onde obteve o diploma de bacharelado em Sociologia (1974), o mestrado (1976) e o doutorado em Educação (1991).
Emecheta trabalhou também no Museu Britânico na década de 1960, e atuou como jovem trabalhadora para a Inner London Education Authority nos anos 1970. Depois que os seus livros se tornaram bem-sucedidos ela deu aulas em diversos lugares, inclusive na Universidade do Estado da Pensilvânia, na Universidade de Rutgers e na Universidade da Califórnia, na Universidade de Los Angeles e de Illinois, entre outras. Ela foi premiada com a Ordem do Império Britânico em 2005.
Vontade de escrever e aprimorar o inglês
A graduação e os pequenos trabalhos eram movidos, desde o início, pela vontade de escrever, aprimorar seu inglês e sua comunicação com o resto do mundo. Após diversas rejeições, recebeu uma oportunidade como colunista no periódico inglês New statesman e ali começou a escrever sobre experiências pessoais. Os textos tornaram-se a base do primeiro livro, In the ditch (Na vala - 1972). Dois anos depois, publicou Second-class citizen (Cidadã de segunda classe).
Cidadã de Segunda Classe |
Cidadã de Segunda Classe, é um romance semiautobiográfico que retrata a luta de Adah, uma jovem nigeriana, contra o machismo e o racismo. Sonhando com uma vida melhor, ela desafia as normas tradicionais e segue para a Inglaterra, apenas para enfrentar novas opressões, especialmente no casamento abusivo com Francis. A narrativa expõe as dificuldades das mulheres imigrantes negras na sociedade britânica dos anos 1960 e aborda temas como independência feminina, maternidade e discriminação. Com uma escrita envolvente e realista, Emecheta constrói uma protagonista perseverante e transforma sua história de sofrimento em uma poderosa denúncia social e inspiração. |
Enquanto seus dois primeiros romances têm caráter autobiográfico com alguns elementos ficcionais, as obras subsequentes apresentam um tom de resgate histórico, tendo como cenário a Nigéria Igbo colonial do início do século XX. A África que sua mãe conheceu.
As Alegrias da Maternidade
Em textos diversos, Emecheta manifestava a necessidade de se comunicar e de atenuar as angústias por meio da escrita. É, portanto, natural imaginar sua reação ao descobrir que uma de suas filhas iria morar com o pai. Devastada, ela escreveu em seguida seu livro de maior repercussão e recepção positiva ao redor do mundo: As alegrias da maternidade (1979), título abertamente irônico, que recebeu sua primeira tradução para o português na edição da TAG enviada aos associados do clube em outubro de 2017. Foi a primeira obra de Emecheta editada no Brasil.
Tendo como cenário a mesma Nigéria colonial da primeira metade do século XX, a obra narra a trajetória de Nnu Ego, uma jovem Igbo, cujas escolhas serão guiadas pelo que é esperado de uma mulher em seu contexto social, ou seja, ser mãe. Depois de casada, Nnu Ego percebe que não consegue gerar filhos, uma das maiores decepções e desgraças para uma mulher de sua cultura. Seus sofrimentos pareciam intermináveis até ela finalmente dar à luz, no entanto, as condições para sustentar os filhos eram cada vez mais precárias.
As Alegrias da Maternidade |
As Alegrias da Maternidade é um retrato poderoso da mulher nigeriana, especialmente de sua luta diante das expectativas sociais e culturais. A obra segue a trajetória de Nnu Ego, uma mulher que sonha com a felicidade da maternidade, mas se vê sufocada pela dura realidade das responsabilidades e sacrifícios que a sociedade impõe. Emecheta aborda temas como opressão, desigualdade de gênero e as complexas relações familiares. Traz à tona uma crítica à subordinação feminina. Com uma narrativa profunda e sensível, o romance questiona o conceito de felicidade e o papel da mulher na sociedade tradicional. |
A vida em Lagos, sua nova e urbanizada terra de moradia, impõe-lhe uma adaptação para a qual não se sentia preparada. Sua vida foi diretamente atingida pelas influências da cultura do colonizador inglês, transformando os valores tradicionais de sua terra de origem.
Os percalços vividos por Nnu Ego refletem uma cultura de violenta opressão patriarcal e colonial. Buchi Emecheta revela em sua obra a prisão em que vive a mulher da Nigéria e sua clara posição de subordinação ao homem, tanto o nigeriano quanto o europeu, com relações de poder diferentes, mas sempre colocando a mulher em posição inferior na sociedade.
Com seu título irônico, As alegrias da maternidade costuma ser utilizado como material de apoio para discutir na escola o peso das expectativas da tradição sobre as mulheres e as mudanças introduzidas pelo colonialismo.
A confiança para poder lidar com o mundo moderno |
Em janeiro de 2017, aos 72 anos, e debilitada pela demência Emecheta faleceu. Sua obra expandiu as representações da mulher africana ao redor do mundo, estabelecendo-a como uma das melhores contadoras de histórias de seu tempo. |
"Existem milhões de mulheres africanas que nunca deixam suas casas, nunca deixam seus vilarejos; esposas em vilarejos continuam na escravidão. Quanto aos meus livros eles podem ser positivos ou pode ser negativos. Mas eu acredito que se você cria uma heroína, seja africana ou europeia, com a educação - não necessariamente com dinheiro, mas educação - ela ganha a confiança para poder lidar com o mundo moderno”. |
Temas da escrita de Buchi Emecheta
A maioria de seus trabalhos de ficção focam a discriminação sexual e o preconceito racial baseados nas próprias experiências como mãe solteira e mulher negra residente no Reino Unido. Sua escrita autobiográfica revela um panorama histórico das mazelas sofridas pelas mulheres durante o neocolonialismo ocorrido nos países africanos entre os séculos XIX e XX.
Os temas relacionados a escravidão infantil, maternidade, independência feminina e liberdade por meio da educação ganharam reconhecimento de críticos e diversas homenagens. Ela classificou suas narrativas como "histórias do mundo, onde as mulheres enfrentam os problemas universais de pobreza e opressão e, quanto mais tempo permanecem, não importa de onde tenham vindo originalmente, mais os problemas se tornam idênticos". Suas obras exploram a tensão entre tradição e modernidade. Ela foi declarada como a primeira romancista negra de sucesso que viveu na Grã-Bretanha depois de 1948.
Algumas das obras publicadas
Romances
Na Vala (In the ditch - 1972) - narra as lutas da jovem nigeriana Adah (o alter ego de Emecheta), na criação dos filhos nas favelas de Londres e seu casamento com um homem londrino. Seu marido decide voltar para a Nigéria, mas ela se recusa. O homem então parte assim mesmo, abandonando sua esposa e cinco filhos. Adah passa então a depender do bem-estar do Estado e de empregos duplos para sobreviver e criar os filhos.
Cidadã de Segunda Classe (Second Class Citizen - 1974) - Na Nigéria dos anos 1960, Adah precisa lutar contra todo tipo de opressão cultural que recai sobre as mulheres. Nesse cenário, a estratégia para conquistar uma vida mais independente para si e seus filhos é a imigração para Londres. O que ela não esperava era encontrar, em um país visto por muitos nigerianos como uma espécie de terra prometida, novos obstáculos tão desafiadores quanto os da terra natal. Além do racismo e da xenofobia que Adah até então não sabia existir, ela se depara com uma recepção nada acolhedora de seus próprios compatriotas, enfrenta a dominação do marido e a violência doméstica e aprende que, dos cidadãos de segunda classe, espera-se apenas submissão.
O Preço da Noiva (The bride price- 1976) - Aku-nna é uma jovem Igbo que vê a vida ruir após a morte do pai. Ela precisa deixar Lagos, junto com a mãe e o irmão, e retornar ao povoado rural de Ibuza, onde vai enfrentar as angústias da adolescência e as rígidas tradições patriarcais do seu povo. Lá, ela se apaixona por Chike, filho de uma família próspera, mas descendente de escravos. Esse amor é considerado uma afronta à cultura dos Igbos. Só que o casal está disposto a tudo para ficar juntos, mesmo sabendo que esse caminho pode ser trágico.
O Fundo do Poço |
O Fundo do Poço é um romance que aborda temas de opressão e superação, na vida de uma mulher nigeriana chamada Adah, que vive a difícil realidade de uma sociedade patriarcal. Ela luta contra as adversidades de um casamento opressor e a exploração de sua condição de mulher. A obra se destaca pela crítica à condição feminina, pela investigação das dinâmicas familiares e pela busca de Adah por liberdade e autonomia. Emecheta apresenta uma história com uma escrita envolvente, que mistura sofrimento e resistência, sobre a força da mulher frente às adversidades.19 |
A pequena escrava (The slave girl - 1977) - vencedor do Prêmio Jock Campbell de 1978 do New Statesman, é uma denúncia à opressão patriarcal sobre as mulheres e seus corpos, tendo como protagonista Ogbanje Ojebeta, uma menina órfã vendida pelos irmãos para um parente distante, depois que doenças e tragédias a deixaram órfã quando criança. Seus companheiros escravos tornam-se, para ela, uma família substituta. Ao se tornar mulher, ela sente a necessidade de um lar, de família, de liberdade e identidade e só então percebe que para isso deve escolher seu próprio destino.
Destino Biafra (Destination Biafra 1982) - o primeiro a apresentar a perspectiva de uma mulher sobre a Guerra Civil Nigeriana.
Obras autobiográficas
Cabeça acima da água (1984; 1986) - quanto à minha sobrevivência nos últimos vinte anos na Inglaterra, diz ela, desde quando eu tinha pouco mais de vinte anos, arrastando quatro bebês frios e grávida do quinto - foi um milagre. E se por algum motivo você não acreditar em milagres, por favor, comece a acreditar, porque tive de manter minha cabeça acima da água nesta sociedade indiferente.
Kehinde (1994) - o enredo gira em torno de uma mulher que, depois de morar em Londres por dezesseis anos, é obrigada a voltar à Nigéria acompanhando o marido. Os conflitos daí resultantes em suas vidas refletem as experiências de muitas mulheres da diáspora africana moderna.
O Legado de Buchi Emecheta |
Londres 2017 - o filho de Emecheta, Sylvester Onwordi, anunciou a formação da Fundação Bush e Emecheta, uma organização de caridade que promove projetos literários e educacionais no Reino Unido e na África. |
03 de fevereiro de 2018 - a fundação foi lançada na Galeria Brunei SOAS, juntamente com novas edições de vários de seus livros publicados pela Onwordi e pela Omenala Press.19 |
Agosto de 2018 - Buchi Emecheta aparece com o número 98 em uma lista de 100 mulheres reconhecidas como tendo mudado o mundo, pela BBC History Magazine. |
Outubro de 2019 - A Gold Smiths, University of London dedicou a Buchi Emecheta um novo espaço de exposição na biblioteca para estudantes. |
Muitos de seus romances revisitam os mesmos temas e inspiram-se em sua vida. Talvez não haja outro escritor africano em cujas obras sua própria biografia esteja tão centrada quanto na dela. Seu trabalho ilumina sua vida enquanto sua vida confirma seu trabalho.
Livros para crianças e jovens
Buchi escreveu também para o universo infanto-juvenil, em projetos para televisão e em uma autobiografia – que inclui, entre outras histórias, as origens de As alegrias da maternidade. Titch the Cat (Arrume o gato - ilustrado por Thomas Joseph ; 1979). Nowhere to Play (Nenhum lugar para brincar, ilustrado por Peter Archer - 1980).
Prêmios recebidos por Buchi Emecheta |
Buchi Emecheta recebeu diversos prêmios e reconhecimentos ao longo de sua carreira literária, destacando-se principalmente pela sua contribuição à literatura africana e feminista. Entre os mais notáveis, estão o New Statesman Jock Campbell Award (1979) pelo livro Second-Class Citizen e o Guardian Fiction Prize (1979) pelo romance The Slave Girl.
Em 2005, foi homenageada com o CBE - Comandante da Ordem do Império Britânico, pelos seus serviços à literatura e à cultura africana. Suas obras, que contém questões de gênero, imigração e identidade, continuam a influenciar e inspirar leitores e escritores ao redor do mundo. |
Sua vida e ficção se alimentam na medida em que seus romances são muitas vezes referidos como relatos “ficcionalizados” de sua vida. Embora Emecheta fosse um símbolo da mulher africana moderna, ela rejeitou ser chamada de feminista. Se fosse, teria de ser chamada feminista com uma letra minúscula 'f' ֎
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