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Foto do escritorPaulo Pereira de Araujo

Útero Errante, Histeria, TPM, Inquisição, Bruxaria e Fogueira

Atualizado: 6 de out.

 

Útero Errante e Histeria

 

A história da histeria remonta à Antiguidade, quando a condição era ligada a percepções culturais sobre o corpo feminino. O termo "histeria", derivado do grego "hystera" (útero), estava apoiada na crença de que ela afetava exclusivamente mulheres devido a problemas uterinos. No Egito e na Grécia da Antiguidade, acreditava-se que o útero se movia pelo corpo e causava sintomas físicos e psicológicos.


Hipócrates (c. 460 a.C. – c. 370 a.C.), médico grego, considerado o "pai da medicina" e conhecido por seus escritos no Corpus Hipocrático. Foi ele quem separou a medicina da filosofia, estabelecendo princípios éticos, o que  influenciou profundamente a medicina ocidental. Mesmo assim, ele tratava a histeria como resultado do "útero errante".


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Considerado um dos fundadores da neurologia moderna, o médico e neurologista francês, Jean-Martin Charcot (1825-1893) considerava a histeria uma doença neurológica. Charcot é conhecido por suas pesquisas sobre doenças neurológicas, como esclerose múltipla e histeria, e por usar a hipnose como tratamento. Seu trabalho influenciou pensadores como Sigmund Freud (1856–1939) e foi fundamental na criação da Clínica no Hospital Salpêtrière, um importante centro de estudo e tratamento de doenças mentais.


Sua abordagem combinava neuroanatomia e histologia na medicina.

Sigmund Freud foi um neurologista austríaco e o fundador da psicanálise. Freud introduziu conceitos como o inconsciente, mecanismos de defesa e a importância da infância na formação da personalidade. Suas teorias sobre a sexualidade e os sonhos influenciaram a psicologia, a literatura e a cultura moderna, embora também tenham sido objeto de controvérsia e crítica.


Freud associou a histeria a traumas e conflitos inconscientes, desmistificando a ideia de que era uma doença exclusivamente feminina. Com o avanço da psiquiatria, o termo "histeria" foi gradualmente abandonado e, nos anos 1980, retirado das classificações de transtornos mentais, sendo os sintomas relacionados relocalizados em categorias como transtornos dissociativos e somatoformes. Os transtornos somatoformes são condições psicológicas nas quais uma pessoa experimenta sintomas físicos sem uma explicação médica clara. Esses sintomas podem incluir dor, fadiga ou mal-estar, e estão frequentemente relacionados a fatores emocionais ou psicológicos.


Por Que Só Com Mulheres?


Embora os sintomas também aparecessem em homens, a histeria foi considerada quase exclusivamente feminina por séculos, devido à associação com o útero. No século XIX, estudiosos como Sigmund Freud reformularam essa visão e destacaram a origem psíquica dos sintomas e desvincularam a condição do gênero feminino. A histeria foi criticada por feministas por representar o controle patriarcal e a patologização de comportamentos femininos considerados inadequados. A história desse diagnóstico revela as relações entre gênero, medicina e poder.


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Relação Entre Histeria e Bruxaria


Durante a Idade Média e o início da Era Moderna, a histeria foi frequentemente associada à bruxaria, com sintomas considerados "histéricos" vistos como sinais de possessão demoníaca. O contexto social, religioso e médico da época interpretava comportamentos e distúrbios psicológicos em mulheres como evidências de forças malignas. Sintomas como convulsões, espasmos e mudanças de humor extremo eram frequentemente considerados indicativos de pactos demoníacos ou influência de espíritos malignos, enquanto hoje são reconhecidos como distúrbios psíquicos, relacionados à histeria ou transtornos dissociativos.


A inquisição e o Malleus Maleficarum


A Inquisição, estabelecida pela Igreja Católica na Idade Média e Moderna, visava combater heresias e bruxaria, utilizando investigações, torturas e execuções. Um marco dessa perseguição foi o Malleus Maleficarum (1487), um manual dos inquisidores Heinrich Kramer e James Sprenger, que identificava mulheres como principais suspeitas.


Comportamentos hoje vistos como distúrbios psicológicos, como crises emocionais, eram considerados sinais de bruxaria. Durante os séculos XV e XVII, a Inquisição perseguiu mulheres vulneráveis ou independentes, usando tortura para obter confissões forçadas. Esse processo reforçou o controle patriarcal, pois a Igreja e a sociedade justificavam a submissão feminina, temendo sua vulnerabilidade à tentação demoníaca.


Transição para Explicações Médicas


Com o Renascimento e o início da modernidade, as explicações sobrenaturais para sintomas "histéricos" foram perdendo força, mas a histeria ainda era vista como uma doença feminina relacionada ao útero e à sexualidade. Somente no século XIX, com o avanço da neurologia e da psicanálise, os sintomas começaram a ser entendidos como de origem psicológica, desvinculando-se da bruxaria. Mulheres com comportamentos considerados "impróprios" frequentemente eram acusadas de bruxaria pela Inquisição.


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Contribuições de Freud


Freud desafiou a noção de que a histeria era uma condição exclusivamente feminina, propondo que seus sintomas eram manifestações de conflitos inconscientes e repressão. Ele identificou casos em homens, associando-os a traumas emocionais. Sintomas como paralisia e cegueira temporária eram vistos como respostas psicológicas a traumas, não apenas problemas físicos.


Antes de Freud, homens com sintomas semelhantes eram raramente rotulados como "histéricos", um viés de gênero nos diagnósticos médicos. Com o avanço da psiquiatria, o termo "histeria" foi substituído por transtornos dissociativos e somatoformes, reconhecendo que esses sintomas podem afetar igualmente homens e mulheres e varia conforme o contexto cultural.


O Papel do Controle Social


A associação entre histeria e bruxaria também significava um controle social sobre as mulheres, especialmente aquelas que não se adequavam aos papéis de gênero ou que viviam à margem da sociedade. Mulheres com comportamentos incomuns ou que desafiavam normas sociais muitas vezes eram acusadas de bruxaria como forma de justificar a repressão ou controle sobre elas. Os julgamentos e execuções de bruxas serviam como uma forma de disciplinar comportamentos desviantes, incluindo sintomas psicológicos que não eram bem compreendidos.

 

Sintomas da TPM e a Suspeita de Bruxaria


Durante a perseguição às bruxas, mulheres com sintomas de tensão pré-menstrual (TPM) eram vulneráveis a acusações, pois a condição não era compreendida. Sintomas como irritabilidade e mudanças de humor eram vistos como desvios de comportamento, desafiando as normas de submissão feminina. O desconhecimento sobre a saúde feminina, aliado a crenças religiosas, tornava comportamentos "diferentes" alvos fáceis. Entre os séculos XV e XVII, o medo do sobrenatural gerava uma atmosfera de vigilância rigorosa, onde qualquer sinal de "desvio" era considerado prova de bruxaria, resultando em julgamentos e perseguições.


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Desvios de Conduta e Perseguição


As sociedades europeias medievais e da Idade Moderna impunham normas rígidas para as mulheres, exigindo obediência, submissão e castidade. Mulheres que se desviassem dessas expectativas, como aquelas com comportamentos "histéricos" (crises emocionais, convulsões, desmaios) ou que questionassem a autoridade, frequentemente eram alvo de desconfiança e acusações de bruxaria. Mulheres independentes ou viúvas, especialmente as que praticavam curandeirismo, e aquelas que exibiam sexualidade fora dos padrões eram vistas como ameaças à ordem social e à autoridade da Igreja, tornando-se alvos fáceis de perseguições.


O Fogo como Purificação


As execuções das "bruxas", muitas vezes na fogueira, eram vistas como uma forma de purificação. Acreditava-se que o fogo era o elemento que purgaria a alma das influências demoníacas e restauraria a ordem espiritual. A fogueira tornou-se um símbolo de punição e controle social para aqueles que desafiavam as normas estabelecidas.


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E se Uma Mulher Grávida Fosse Acusada de Bruxaria?


Quando mulheres grávidas eram acusadas de bruxaria durante os julgamentos da Inquisição, a situação gerava dilemas éticos e religiosos. Embora as respostas variassem conforme a época e a região, a suspensão da execução era comum. Muitas vezes, a execução era adiada até o parto devido à preocupação com a vida do inocente bebê. O ato de executar a mulher antes do nascimento do filho era considerado injusto, já que o feto não havia cometido nenhum crime. Entretanto, a mulher não era absolvida e permanecia presa até dar à luz, quando a execução poderia ocorrer normalmente.


Justificativas Religiosas


Durante a Inquisição, a execução de mulheres grávidas era frequentemente adiada com base em princípios teológicos, já que a Igreja considerava a alma do bebê pura. Matar a mãe antes do parto era visto como um pecado maior, pois resultava na morte de uma vida inocente. Após o parto, as crianças eram geralmente entregues a instituições religiosas. No entanto, a morte da mãe poderia levantar suspeitas de bruxaria. Embora o adiamento fosse comum, execuções sumárias ocorreram em períodos de pânico religioso, e a gravidez em situações "imorais" era vista como sinal de ligação com o demônio.


Mulheres Acusadas por Outras Mulheres


Durante a caça às bruxas, rivalidades e conflitos em comunidades rurais levaram mulheres a se acusarem mutuamente. A inveja de mulheres bem-sucedidas e disputas por terras contribuíam para denúncias. Eventos negativos eram atribuídos ao sobrenatural, tornando as "diferentes" alvos fáceis, especialmente em histerias coletivas, como em Salem (1692), onde torturas forçavam acusações, perpetuando desconfiança e medo.


Como a Histeria é Considerada Hoje?


O termo "histeria" foi abandonado como diagnóstico médico devido a preconceitos de gênero, sendo substituído por classificações mais precisas no DSM e na CID, como transtornos de ansiedade e dissociativos. Avanços em neurociência e psiquiatria melhoraram a compreensão dos sintomas psicossomáticos. Os sintomas anteriormente associados à histeria são agora tratados como Transtorno de Conversão e Transtornos de Ansiedade, com uma abordagem mais científica e humanizada, focada em tratamentos individualizados e baseados em evidências.


Entretanto, ainda assim o comportamento das mulheres sofre julgamentos de uma certa forma ligados a preconceitos de gênero como: Cuidado, ela hoje está com tpm! Mulher é muito ansiosa... Ninguém entende as mulheres... Portanto, pense bem no que você ouve e fala sobre as mulheres, para não correr o risco de propagar conceitos que não fazem mais sentido e devem ser esquecidos para sempre֎


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